Quadrado Textil

Quadrado Textil
Lenço (latin linteum, -i, pano de linho) s.m. Peça de roupa, que consiste num pedaço de tecido, quadrado, com que se abriga o pescoço ou a cabeça.

quarta-feira, 18 de outubro de 2017

Amor-perfeito

O fim-de-semana começara mal. Um denso e frio nevoeiro encobria a manhã de sábado. Parece ainda mais impenetrável quando se tem planos de passear com a companheira, embora nos dê alguma privacidade, porque ainda há quem olhe de lado quando passam duas mulheres de mão dada, enamoradas.
Acordadas bem cedo não seria o clima que nos impediria de caminhar até ao Guincho.
Durante o nosso reforçado pequeno-almoço, enquanto planeávamos o trajecto, eu tinha uma meia surpresa para a Carla. Um Amor-perfeito, que tinha acabado de dar flor. Ela sabia que eu tinha as sementes, que as tinha plantado, cuidado e regado até nascer esta obra-prima da natureza. A meia surpresa foi apenas por eu ter insistido em lhe oferecer sem um aparente motivo.
- É um presente para ti.
- A flor já abriu! Está linda. Que querida. Obrigada, Rita. - Agradeceu espantada.
- Queria muito dar-te antes de sairmos.
- Há alguma razão escondida? - Questionou muito curiosa.
- Há.
- Conto-te pelo caminho. Na volta abres este envelope que deixo na mesa.
Agora vamos preparar para sair e aproveitar a manhã. - Ordenei despachada.
- O que tem o envelope? - Curiosa perguntou.
- Na volta abres. Só na volta. - Insisti.

Descemos, no elevador, até à garagem e partimos para a curta viagem até ao percurso pedestre junto ao mar.
O nosso fiel Fiat 500 ficou estacionado num local sossegado e aparentemente seguro, junto a umas vivendas, a poucos quilómetros do nosso destino.
Carla, muito práctica, de fato de treino e de lenço em fita a lhe prender o cabelo, que lhe fica muito bonito e feminino. Eu preferi as minhas calças de corrida, sweater e rabo-de-cavalo. Gosto de ver mas não tenho o seu jeito para colocar lenços.
Arrancamos decididas penetrando o nevoeiro, que até dava um ar místico à manhã e já começara a se dissipar.
Aproveitei para apresentar a minha ideia com subtileza.

- Gostaste do meu presente? - Iniciei discretamente.
- Claro que gostei. Não fazia ideia que a tinhas semeado propositadamente para mim.
- E de tudo o que mais te faria feliz? - Perguntei manhosa.
- Tu sabes mas porque perguntas agora?
- Porque quero que me digas novamente.
- Estás estranha... - Suspeitou.
- Vais perceber mais tarde. Dizes-me?
- Está bem. Quero ter um filho. Quero engravidar. Tê-lo naturalmente. E quero ter contigo, faze-lo por gosto mas isso não é possível
- E alternativas?
- Porque são essas perguntas todas? - Ainda mais desconfiada.
- Só quero perceber uma coisa e que também vais perceber. Segue-me desta vez. Peço-te.
- Pronto. Diz lá.
- E alternativas? - Insisti.
- Adoptar é complicado para duas mulheres e queria também passar pela gravidez, como te disse antes; banco de esperma parece muito artificial e quero fazer por amor. Tentar arranjar um voluntário para me engravidar seria quase tão mau como uma violação. Não vejo forma.
 Já chega? Respondi a tudo? - Um pouco tensa com as perguntas
- Já. Obrigada. - Apertando carinhosamente a sua mão enquanto caminhávamos.

Percebia-se o seu desconforto por esta minha insistência e, por isso, andamos largos minutos em silêncio.
Ficou a tentar encontrar um sentido na minha conversa até que não resistiu a quebrar esse silêncio.
- Rita. Que perguntas foram aquelas? Que mistério é esse? E o envelope? Até a flor que plantaste para mim foi inesperada. Podes explicar tudo isso?
- Claro que posso. Foi uma ideia que tive. Explico depois de me responderes a uma última questão.
- Mais uma? Diz lá.
- A flor que eu semeei e te ofereci fui eu que recolhi a semente e deixei secar. Era a semente de uma flor de um amigo. Agora que sabes pensas neste amigo quando olhas para a flor?
- Obviamente que não. Nem o conheço e tu tiveste todo o trabalho de recolher, semear e cuidar da planta até dar flor, para me ofereceres. Foi muito mais especial que imaginei. Foste muito querida. Obrigada. - Colocando a sua mão direita na minha cara e docemente beijando os meus lábios.
- E se eu te plantasse um filho ias pensar no amigo, que ofereceu a semente, quando o bebé nascesse?

Carla parou no meio do caminho, muda, imóvel e quase inexpressiva, olhando fixamente para mim. Processava toda aquela informação tão envolvida em mistério como nós pela névoa.
- Tens algo planeado que não me tenhas contado? - Um pouco atordoada.
- Estou a contar-te agora.
- Há quanto tempo começaste a planear?
- Muito.
- Foi tudo premeditado neste passeio?
- Quase tudo. O Amor-perfeito por sorte abriu. Tinha esperança que fosse hoje.
- E o "fornecedor da semente"?
- Tenho.
- Como o conseguiste?
- Graças ao que tens na cabeça.
- Mas não tenho nada. - Passando a mão pelo cabelo.
- Vê melhor.
- O lenço?! - Ainda mais confusa.
- Sim. Eu conto pelo caminho - Esticando a mão num convite implícito para continuar a passear.
- Quando me pediste um lenço emprestado, para usares, já fazia parte do plano?
- Sim, fazia. Como te lembraste? Foi quando o persuadi. Já foi há meses.
- Lembrei-me porque tu nunca usas lenços e fiquei surpreendida.
- Também não te escapa nada.
- Como se convence alguém para algo como isto, apenas com lenços?
- Nem imaginas o poder que os lenços podem ter sobre raras pessoas. É aquele velho amigo que já te falei e contei-te desse fetiche.
- Lembro-me de me falares em alguém assim.
- Ele é saudável, normal em tudo excepto nesse segredo, advogado de profissão e não é feio.
- Falas como se tivesses tudo combinado. - Reagiu renitente.
- Não está nada agendado. Apenas te quis mostrar que era possível se quiseres. Eu conto-te como se procederia caso assim decidas.
Pelo caminho conto os detalhes. Encontrei forma de o fazer sem teres nenhum contacto com ele. Eu recolho a semente e planto em ti, só entre as duas.

Todo o caminho foi um monólogo enquanto lhe contava todos os pormenores detalhando um minucioso plano. Carla manteve-se em absoluto silêncio, quase em estado de choque pelo cenário que se desenhava.
De volta ao carro, cansadas, suadas e sedentas, enquanto terminávamos as nossas águas, subitamente diz:
- Rita... Quero fazer isso. - Calando-se de seguida.

Não esperava já a resposta. Sem palavras abracei-a longamente.
Entramos no carro e voltamos a casa com um indisfarçável sorriso.
- Vou preparar tudo e a partir de agora medimos-te a temperatura todos os dias.
- Combinado. - Respondeu num tom prudente.

Ao entrar em casa virou, de imediacto, para a cozinha. Ainda havia o misterioso envelope.
Rasgou-o energicamente e retirou uma missiva, muito bem escrita por mão de advogado, declarando prescindir de direitos sobre uma criança que possa nascer de uma sua doação de esperma.
- Não descoles o post it. Não vais querer saber o nome. - Supliquei
- Não. Não vou.
- Obrigada. - Agradeci preocupada
- Isto foi escrito pelo teu amigo com o fetiche dos lenços?
- Foi. Tudo conforme a lei para não haver imprevistos. Dá jeito que seja advogado.
- Nunca imaginaria que premeditarias nada deste género. - Respondeu num tom sarcástico.
- Nem eu. - No mesmo tom.

Passada uma semana, logo de manhã, num oportuno sábado, fui acordada suavemente.
- Rita... Já estou com mais meio grau. Devo estar fértil.

Abri os olhos, sorri-lhe docemente, dei-lhe as duas mãos e carinhosamente apertei.
- Vou já ligar e preparar tudo. - Avisei de seguida.
- E o que faço eu? - Perguntou ansiosa.
- Ajudas-me na preparação. Trazes-me os teus lenços para escolhermos? - Pedi decidida.

Tinha o guião muito claro na minha mente.
Fiz o telefonema e combinei para as dez. Tínhamos cerca de duas horas. Arrumamos o quarto, tomamos um generoso e saudável pequeno-almoço antes do banho, vestimo-nos confortáveis e prácticas, preparamos a sala, posicionando o cadeirão de braços de frente para a janela e de costas para a porta que dá para o hall, colocamos as colunas de som junto a essa porta e ligamos a aparelhagem num volume suficiente para criar uma barreira musical entre a sala e o resto da casa mas sem ser excessiva nem desconfortável.
Apenas faltavam os últimos mas mais importantes detalhes: o inseminador - um tubo arredondado na ponta, com um êmbolo - e os lenços.
- Vamos escolher lenços?
- Vamos. - Respondeu abrindo a sua gaveta.
- Primeiro escolhes um para eu usar na cabeça?
- Em fita? - Perguntou em tom de afirmação.
- Não. Em triângulo estilo camponesa. Deixa-o mais preparado para a doação.
-Ele fica excitado ao ver-te de lenço à camponesa? Tu é que sabes. - Acutilantemente comentou tão surpresa como divertida.

Rita escolheu um lenço pequeno e vermelho para ser ainda mais vistoso e provocador.
- Pões-me? - Docemente pedi por ter muito menos experiência que Rita no que toca ao uso de lenços.

Cuidadosamente dobrou o lenço num triângulo, puxou o meu cabelo para trás, colocou-o sobre o meu cabelo deixando de fora um pouco da franja e atou bem justo atrás da nuca, deixando as pontinhas ligeiramente visíveis do meu lado esquerdo. Muito séria verificou todo o trabalho e corrigiu pequenos detalhes. Afastou-se ligeiramente e abriu um iluminado sorriso.
- Ficou-te tão bem. Tens de pensar em usar mais vezes.
- Obrigada. A arte é tua. Vamos escolher outros de acordo com o plano? - Novamente pedi.
- Vamos, claro. - Concordou sem hesitar.
- Estes dois pequenos, mais velhos, de algodão muito fino e gasto. São muito macios e não escorregam.

Pareciam perfeitos para vendar. Um lenço todo castanho, escuro, de borda ligeiramente acetinada e outro em riscas vermelhas e azuis escuras. Ambos muito anos setenta. Rita percebia a dinâmica dos lenços e escolhia determinada.
- Faltam mais dois. Bastam estes.

Eram dois lenços, também quadrados, grandes, sintéticos que, em diferentes promoções, teriam sido oferecidos como complemento de alguma peça de roupa. Nunca os usara mas por serem de fácil arrumação deixou-os guardados.

Retirei do saco, muito bem lavado e desinfectado, o aplicador vaginal. Era este o meio para lhe semear. Enrolei-o numa toalha húmida e morna tanto para o deixar escondido como para que não sentisse incómodos no momento principal. Tudo fora meticulosamente planeado.
Ambas de pé, começo a despi-la, frente a frente, olhos nos olhos, peça a peça. Por baixo agarro a t-shirt e começo a subir lentamente. Rita levanta os braços num implícito consentimento. Não usava nada por dentro revelando logo os seus seios. Beijo-os longamente. Pela cintura baixo-lhe as leggings até retirar e repito com as cuequinhas, sempre docemente arranhando sua tez. Sento-a na cama e descalço-a rapidamente.
Agarro no lenço castanho fazendo cuidadosamente uma fita.
- São estes que nos vão ajudar - Comentou Rita ainda incrédula.
- Vão. Vão mesmo - Insisti

Beijei-lhe cada olho e suave e firmemente atei o lenço.
Continuei percorrendo seu corpo com beijos. Tinha vontade de me despir. Não podia. Ainda não...
Empurrei-a com cuidado deixando-a deitada, receptiva ao que viria. Percorria levemente o seu corpo com os dedos, em todo o comprimento, do pescoço aos pés e volta, com uma mão de cada lado, de forna previsível e repetitiva. A meio caminho o meu dedo cuidadosamente explorava toda a sua profundeza e retomava o percurso.
Toca a estridente campainha. Coloco um dedo sobre os seus lábios como se selasse o seu silêncio.
- Shhhhh. Já volto. - Levantando-me prontamente para abrir a porta.

Como previsto era o meu amigo. Disponível para nos oferecer o melhor presente.
Abro a porta sem disfarçar o meu sorriso e curiosa em saber se o meu acessório tem o pretendido efeito.
Os seus olhos denunciam-no no mesmo instante que o cumprimento.
- Olá. - Num tom médio grave a tentar criar um ambiente sensual.
- Olá. - Respondeu tentando não parecer constrangido.

Não resisti a dar-lhe um profundo e sentido abraço consciente que o teria persuadido fazendo uso do seu mais íntimo segredo e do valor da sua oferta.
Não ficara nada indiferente a sentir o lenço assim tão perto.
- Gostaste? - Referindo-me subtil e implicitamente ao meu lenço na cabeça.
-Muito. Devias tentar usar mais vezes. - Elogiou com a mesma frase que já hoje tinha ouvido.

Dei-lhe a mão e levei-o para a sala. Já sabia o que tinha a fazer.
Deixei-o a se preparar enquanto voltei ao quarto para manter Carla quente. Vendada, coberta apenas com o lençol, expectante e um pouco perdida transbordava sensualidade. Retomei exactamente onde tinha parado. Voltei a percorrer seu corpo de cima a baixo. Voltei a procurar a sua profundidade. Sentia o seu corpo a contorcer-se mas ainda não podia ir mais longe.
- Já volto. - Avisei.
- Volta depressa. - Respondeu em tom de desejo.

Peguei nos lenços e no aplicador bem envolvido na toalha morna, e dirigi-me à sala. Lá estava perfeitamente preparado como havia sido combinado: sentado no cadeirão virado para a janela, com a toalha sobre o colo, as calças e boxers dobrados e colocados sobre a mesa, pronto para os finais detalhes.
O seu olhar fixado no lenço que uso na cabeça é sinal que está a ficar como me interessa.
Em silêncio dobro o lenço azul e vermelho em fita e de forma provocadora ato sobre os seus olhos. Com os dois que sobram ato cada pulso a cada braço do cadeirão. Apenas uma volta e um nó justo para sentir que não quero que participe nem me toque e, principalmente, por saber que o deixam ainda mais descontrolado.
- Faço eu tudo. Não digas nada - Confirmei embora estivesse previamente combinado.

Ficou obedientemente em silêncio mas a toalha já não era suficiente para esconder a sua rigidez. Estava no ponto certo.
Retirei a toalha. Lá estava pronto para a colheita. Não estava certa de como faria mas as dicas de uma amiga casada e o meu amigo Google foram ajudas perfeitas. Agarrei com alguma hesitação, por ser a primeira vez que agarrava um homem, mas rapidamente observando as suas reacções percebi como funcionava. O estado provocado pelos lenços, durante a sua aplicação deu-me um ponto de partida e, em pouco tempo, já escorria a preciosa semente, cuidadosamente recolhida no aplicador. Voltei a enrolar esse aplicador na toalha morna
Coloquei a toalha, que o cobriu inicialmente, no seu colo e soltei-lhe um pulso.
Fui de imediacto para o quarto e, novamente percorri o corpo de Carla carinhosamente de cima para baixo. A primeira volta foi uma repetição das anteriores mas à segunda, a sua profundidade fora conquistada pelo aplicador em vez do dedo. Ao chegar ao fundo era completamente despejado e o percurso retomado.
Ele saíra só e discretamente.
Estava, por mim, plantada a semente. Ficamos longamente disfrutando do momento até ao esgotar da energia.
- Fica mais um pouco sem tirares o lenço dos olhos.
Mesmo sem perceber Carla deixou-se assim ficar, ouvindo-me movimentar pelo quarto e casa.
Finalmente, após a breve espera, concluída com um leve beijo nos lábios, desatei o lenço que a mantém no escuro com um suave cuidado.
Não havia vestígios nem de desarrumação, nem da preparação, nem do meu amigo. Sobre o parapeito da janela coloquei, muito intencionalmente, a planta oferecida.
Sentia que tudo acontecera como se fosse apenas entre as duas.
- Agora percebo o amor-perfeito por ti plantado.


QT

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