Quadrado Textil

Quadrado Textil
Lenço (latin linteum, -i, pano de linho) s.m. Peça de roupa, que consiste num pedaço de tecido, quadrado, com que se abriga o pescoço ou a cabeça.

quarta-feira, 1 de julho de 2020

50 Lenços Mais Sombrios

Era bem tarde e toca o telemóvel. Como aparecia o nome da minha amiga Eduarda no ecrã atendi. Não era costume ligar tão tarde.
- Estou?
- Olá Ana. Consegui o contacto que me pediste, na ElectronGen. - Logo directa ao assunto. Excitada por poder dar a notícia.
- Que bom Eduarda. Foste mesmo rápida. Como conseguiste?
- Tive alguma sorte. Apanhei-o num momento menos ocupado. É raro mas acontece.
É para ires já amanhã. Às oito da manhã.
- Espera... Não percebo quem apanhaste.
- O Christian.
- Já amanhã cedo? - Surpresa pedi a confirmação.
- Sim. Por isso te liguei a esta hora. Já te tinha tentado ligar.
- Só agora vi. Tinha o telemóvel descarregado.
- E a quem me dirijo?
- A ele. Ao Christian.
- Ao CEO?
- Sim esse mesmo. Na sede.
- Ai, Eduarda, és espectacular. Obrigada.
- De nada amiga. Consegues preparar o teu material para amanhã?
- Claro que sim. Tenho tudo no tablet. Só não sei que vestir para falar com alguém tão rico e importante. O que achas?
- Ele é informal. Não precisas preocupar muito. Vai simples e profissional. 
- Assim é fácil. 
- Só há um pequeno detalhe que suspeito que goste.
- Que detalhe?
- Usa um lenço.
- Lenço como o da vossa farda?
- Não é para usares igual. Um lenço com que te sintas confortável e que complete a tua roupa. O meu sexto sentido acha que pode ajudar a causar boa impressão.
- Está bem. Obrigada.
- Agora vai dormir para ires fresca amanhã. Beijinhos.
- Beijinhos

O despertador tocou às seis e meia da manhã. Isto podia vir a ser importante para a minha pequena empresa e não queria correr o menor risco de chegar atrasada. Aproveitei para reunir e rever a documentação, para que nada falhasse, enquanto tomava calmamente o meu pequeno-almoço.
Vesti-me de forma simples mas sem deixar de ser sofisticada. Calças pretas skin e blusa toda branca.
Apenas faltava aquele detalhe que a Eduarda indicou.
Tirei os poucos lenços que tinha na gaveta. Raramente usava. Descobri um lenço de padrão colorido sobre fundo preto. Condizia e dava alguma alegria à minha roupa. Dobrei em fita e atei cuidadosamente no pescoço. O nó para a frente não me parecia bem. Puxei-o um pouco para o lado. Ainda não! Parecia forçado. Voltei a refazer o nó à frente. Mesmo assim não me parecia bem. 
Agora me lembro porque só raramente uso lenços..
Rodei o nó para trás ficando apenas uma faixa no pescoço. De frente não me parece mal. De lado também não. Decidi ir assim mesmo sem perder mais tempo.
Um casaco leve e fiquei pronta para partir.
Cheguei vinte minutos antes da hora. Aproveitei para observar com uma atenção que nunca tivera ao passar por esta zona. Todo um quarteirão de antigos prédios de cinco andares meticulosamente restaurados num único enorme edifício sede, respeitando a arquitectura original, na zona velha da cidade.
É curioso ter este aspecto tão antigo para albergar uma empresa tão moderna.
Entro, ainda com dez minutos de antecedência, dou o nome à entrada e indicam-me a direcção do gabinete do CEO. Não pude deixar de reparar na farda da recepcionista. Embora simples apresentava um ar retro. Lembrava as fardas das companhias aéreas dos anos cinquenta com o pescoço muito bem composto por um lenço meticulosamente colocado. 
Subo escadas pedra com corrimão de madeira. Embora ao lado estivesse um antigo elevador de grades não estava certa que estivesse em serviço.
Ainda antes de chegar ao gabinete sou gentilmente abordada.
- Olá Ana. Bom dia. - Ouvi pelas costas.
- Bom dia. - Respondi surpresa mas sem hesitar.
- Sou Christian. Já estava informado que tinha chegado - Apresentou-se de imediacto e esclareceu, apercebendo-se do meu ar surpreendido.

Tinha um ar mais descontraído que nas imagens da comunicação social. Informal, como disse a Eduarda, bem-parecido e aparentemente simpático.
Fiquei com a subtil sensação que me teria observado o arranjo no pescoço.

- Entre e sente-se. Fique à-vontade. Posso oferecer-lhe um café? - Gentilmente perguntou.
- Obrigada. Já tomei. 
- Então falemos de negócios.
Antes de mais conhece a empresa?
- Conheço o que é do domínio público. Que produzem motores e geradores eléctricos para todo o mundo e que a vossa tecnologia oferece a maior eficiência energética do mercado. Sei que esta é a sede mas confesso que desconhecia que tinham reconstruido os prédios antigos.
- De facto percebeu o âmbito do nosso negócio. A sede, sempre foi meu desejo que estivesse localizada numa zona simbólica da cidade mas necessitava de um grande edifício. Quando me apercebi que quase todos estes prédios estavam degradados e vazios coloquei uma equipa, durante um ano, com a missão de adquirir todo o quarteirão. Depois foi cuidadosamente restaurado, mantendo o máximo dos elementos originais e ao juntar todos os edifícios aumentou a funcionalidade.
- Ficou linda. - Elogiei sinceramente, sem segundas intenções de criar boa impressão para o negócio.
- Obrigado. A Eduarda informou-me quem gere uma empresa de serviços de limpeza ecológica e adaptável e vem no sentido do que pretendia para aqui. Já percebeu o nosso ambiente um pouco retro e de alguma forma caseiro? Fale-me do que tem para oferecer e a forma de se enquadrar. 
- A minha empresa fornece serviços de limpeza mas diferenciamo-nos pela nossa responsabilidade e adaptação. Responsabilidade ambiental, não só pelos produtos 100% bio-degradáveis como pela gestão dos recursos, de forma a evitar consumos desnecessários de água ou electricidade. Por exemplo: regamos as plantas e, sempre que possível, reutilizamos água das limpezas.
Responsabilidade social porque os nossos colaboradores auferem um salário, acima da média desta actividade, que lhes permite ter um nível de vida razoável e é proporcionada todo o tipo de formação conforme as necessidades e com regularidade. Finalmente a adaptabilidade ao meio. Ao contrário das outras empresas em que os funcionários são todos vestidos de bata e touca nós adaptamos as fardas conforme o ambiente do cliente.
- Eu vou fazer chegar-lhe as plantas com as zonas do edifício, hoje antes do almoço.
Quando tem um orçamento? 
- Amanhã antes do almoço. - Aproveitando as suas palavras.
- Excelente. Obrigado.
- Obrigada. - Levantando-me e inconscientemente passando a mão pelas pontas do lenço do pescoço, puxando-as ligeiramente à frente sobre o ombro.

O seu olhar fixou-se nesse instante e, logo de seguida, desviou-se.
Preparava-me para sair, já junto à porta, quando subitamente me chama:
- Ana. Terá a sua resposta durante o almoço. - Subtilmente convidou.
- Almoço? – Questionei surpresa.
- Sim almoço. Prometo que vai gostar.
- Está bem. Combinado - Após uma breve hesitação de charme.
- Consegue estar ao meio dia?
- Consigo. 
- Até amanhã.
- Até amanhã. Obrigada.

Voltei ao trabalho e reuni com a equipa para delinear e orçamentar a proposta. Indiquei a necessidade de apresentar pelo menos três esboços para as fardas que se enquadrassem naquele ambiente, sugerindo um pequeno detalhe que suspeitei poder ser persuasivo...
Era importante estar pronta a enviar antes do final do dia. 
Mais tarde, no sossego do lar, liguei à Eduarda para contar as novidades.
- Olá Eduarda. Estive lá hoje, como combinado.
- Olá Ana. Como correu? Vais me contar tudo.
- Correu muito bem. Ele é muito simpático e práctico. 
- E achas que consegues o negócio para a tua empresa?
- Não sei. Amanhã dá-me uma resposta durante o almoço.
- Durante o almoço como? Manda um email até essa hora? - Inquiriu confusa.
- Não. Mesmo durante o almoço. - Reforcei.
- O Christian convidou-te para almoçar? - Após um longo silêncio de espanto.
- Aparentemente convidou.
- Não acredito! Como conseguiste? É o solteirão mais cobiçado do país.
- Não fiz nada. Ele simplesmente convidou.
- Depois vais me contar, não vais? - Pediu muito curiosa.
- Não vai haver muito para contar. Vai, apenas, dar uma resposta profissional.
- Ana. Ele não tem hábito de convidar ninguém para almoços de negócios. 
- Não sejas alcoviteira. Vou ter de ir. Amanhã vou ter um dia grande.
- Ou um grande dia. - Satirizou num atrevido trocadilho.
- Beijinhos
- Beijinhos e até amanhã.

No dia seguinte vesti-me cuidadosamente, no mesmo estilo. Lembrei-me do pormenor do lenço. Deu-me sorte mas não condizia com a roupa que levava. Não tinha outro do mesmo estilo. Resolvi atar na mala o que usara na véspera e logo se via.
Pouco antes do meio-dia e meia chego à ElectronGen. 
Anunciada na recepção subi em seguida ao seu gabinete. Fui logo recebida e, sem formalidades nem demoras, saímos para almoço. 
- Podemos ir a pé? Não é longe e o estacionamento quase impossível. - Perguntou justificando em seguida.
- Claro. Gosto de andar.

Subimos um íngreme e estreita ruela para um pequeno restaurante com uma incrível vista. Valeu a pena o esforço para cá chegar.
Cristian é reconhecido à chegada e nem precisa de mencionar a reserva. Dirigimo-nos para um exclusivo terracinho, com uma mesa apenas, já pronta com petiscos de uma minuciosa simplicidade. Deste local a vista é ainda mais espantosa. 
Afastou a cadeira para me sentar. Sorridente aceitei e coloquei o portátil e a mala sobe um pequeno patamar. O seu olhar rápido, quase de rapina, parece ter, por um instante, fixado o lenço atado na alça. Pode ser sugestão. Porque o faria?
O empregado de mesa, muito discreto e suave, aproximou-se sem que eu desde por isso.
- A menina o que deseja beber?
- Depois desta subida apetecia-me apenas uma limonada com pouco açúcar. 
- Com certeza. - Retirando-se prontamente após uma breve troca de olhares com Cristian e uma discreta confirmação de cabeça.
- Não lhe perguntou o que ia beber? - Não resisti a perguntar.
- Perguntou. E eu respondi que bebia o mesmo. Já me conhece há muito.
- Só com o olhar?
- Sim. E estou certo que não ficou com dúvidas.
- É muito práctico. 
- Vamos ao que nos trouxe aqui. Mostre-me novamente os uniformes propostos - Avançando directamente ao assunto como percebi ser seu registo habitual. 
- Tenho aqui os esboços, já com todo o detalhe - Indiquei enquanto retirava o tablet da mala.
- Analisei os que me enviou mas gostava de rever.
- Como indicado temos três propostas: a standard, bata e touca de cor sólida; a retro: bata/avental de corte retro e lenço na cabeça preso atrás; e a rústica: jardineiras e boné.

Tinha uma suspeita de qual seria a sua preferência. Não tardou a confirmar. 
- A segunda hipótese, a retro, é a que melhor se enquadra no edifício. - Escolheu sem hesitar mas sem qualquer referência ao lenço da cabeça.
- É a primeira vez que apresentamos uma farda deste tipo.- Sorridente respondi.
- Sendo assim está adjudicado o serviço. Vou lhe indicar o contacto da gestão do edifício. A partir deste momento tratará tudo com eles - Esticando a mão para selar o negócio
- Muito obrigada. - Agradeci com um indisfarçável sorriso por ter conseguido um valioso contrato em apenas dois dias.
- Concluído o trabalho desfrutemos do almoço. - Rematou assertivo.
- Sim. De acordo. - Respondi sem nada acrescentar.

Neste local, perfeito para almoçar, a vista, a ementa, o serviço e a muito interessante companhia faz me correr o risco de ficar demasiado descontraída. Sem me aperceber que toda a formalidade subitamente se extinguira conversávamos com toda à-vontade.
- O que achas deste local? - Pergunta com o seu penetrante olhar como e procurasse mais que uma resposta.
- É lindo. Como conseguiste esta mesa assim de um dia para o outro? Não deve ser fácil. 
- Não foi difícil. Tenho aqui alguns privilégios. - Sem divulgar protegido pelo simples sorriso.
- Estou a perceber que tens contactos importantes.
- É inevitável quando se tem um negócio da dimensão da ElectronGen. Mas nem tudo são facilidades. 
- É verdade que te deslocas de transportes públicos para o trabalho?
- É. - Numa curtíssima e directa resposta.
- Mas até motorista podias ter.
- Podia - Mantendo o estilo das respostas curtas.
- E porque não tens?
- Porque tenho metro junto a casa e uma saída à porta da empresa, porque não gosto de sentir diferente nem pretensioso. E quando ando de carro gosto de ser eu a controlar - Num tom subitamente mais sério.
- E fica muito bem. Principalmente para quem tem uma empresa destas. Poupa emissões poluentes.
- No meu caso a poupança não tem muito significado. O meu carro é eléctrico e é carregado com energia vinda de eólica ou foto-voltaica. Mas não falemos apenas de mim. Conta-me de ti.
- Como assim? Que queres saber?
- Por exemplo como foste parar a essa empresa? 
- Foi simples: com colegas do curso de gestão à procura de emprego resolvemos unir esforços, conseguimos incentivos e criamos esta empresa. 
- Então somos colegas empresários - Sorrindo abertamente
- Sim mas de grandezas muito diferentes.
- A dimensão é temporária. Tudo muda e evolui.

A conversa manteve-se animada enquanto saboreávamos aquela deliciosa refeição.
Christian estava sempre discretamente atento aos detalhes. Nada lhe escapa. Esperou cuidadosamente até que eu terminasse para também cruzar os seus talheres e aproveitou o momento para voltar a convidar.
- És uma óptima companhia. Temos de repetir.
- Podemos repetir - Respondi um pouco desprevenida.
- Depois de amanhã. Aqui novamente. Que achas?
- Sim. Parece-me bem. 
- Eu mando buscar-te ao meio dia e meia. É oportuno?
- Sim. Obrigada.

Quando me apercebo já está servida uma vistosa sobremesa de frutas e gelado. Tudo de forma tão eficiente como discreta.

- Surpresa? - Novamente com aquele penetrante olhar. 
- Sim. Muito. Tudo aqui é surpreendente. Há um sabor especial nas surpresas. E nesta principalmente. Confesso que gosto de ser surpreendida.
- Que bom. Gosto de conseguir surpreender.

Já me esquecia que era dia de trabalho. Não me podia prolongar demasiado e devo ter deixado transparecer essa preocupação ao olhar para o relógio.
- Estás sem tempo? - Reparou de imediacto.
- Não tenho muito - Diplomaticamente respondi.
- Então vamos já sugeriu. 

Levantamos-nos rapidamente. Peguei na mala fazendo ondular as pontas do lenço atado na alça. O seu olhar novamente captou o movimento quase sem se notar.
Saímos prontamente. Reparei que nem precisou pagar. Apenas agradeceu respeitosamente.
À saída estava um Tesla, com o logótipo da ElectronGen, parado preparado para sair.
Permite-me que o motorista da empresa te leve para não perderes tempo. Eu desço a pé.
Despedimos-nos com dois beijinhos.
- Obrigada. - Inocentemente segurando a sua mão.
- Tive todo o gosto. - Cravando o seu olhar no meu.

Passei a tarde apática sem tirar o merecido partido do sucesso deste negócio. Algo se passara que não conseguia perceber. 
Tinha sido demasiado bom para almoço profissional. Paira, agora, um confortável desconforto que não estava previsto.
Ao chegar a casa sei que devia ligar à Eduarda para contar o sucesso e voltar a agradecer mas vai me fazer demasiadas perguntas para as quais não tenho resposta nem sei se quero responder. Nada adiantou. Pouco depois tocava o telemóvel.
- Ana, olá. Quero que me contes tudo. Almoçar com o Christian não é para todas.
- Olá Eduarda. Posso dizer que correu muito bem. Vamos assinar contrato. E tudo graças a ti. Muito obrigada. - Na esperança de abreviar o tema.
- Sim, sim... E o almoço com ele? Como foi. - Roendo-se de curiosidade.
- Simpático.
- Conta-me mais detalhes. É raro ele almoçar com alguém da empresa ou com alguma ligação. Costuma ir só e por motivos especiais.
- Está bem eu conto. Convidou-me para almoçar novamente. Mas nada mais. - Rematei, dando a perceber que não me alongaria nos comentários.
- Ok. Já percebi. Sempre foste reservada. Mas tem cuidado que, embora seja muito discreto, ele tem fama de ter gostos invulgares. Mas não se sabe o que é.
- Nem me interessa saber coisas dessas. - Embora estivesse demasiado curiosa.
- Apenas te peço que tenhas cuidado. Alguma razão deve haver para um homem perto dos quarenta estar só.
- Não te preocupes. Sei cuidar de mim. Agora tenho de ir. Beijinhos.
- Beijinhos.

Esta conversa não me deixou preocupada. Apenas inquieta e curiosa. 

Passados dois dias, aproximava-se a hora de almoço. Há minha espera estava o motorista da ElectroGen. Levou-me até ao simpático restaurante onde Christian já esperava.
- Olá Ana. - Sorridente cumprimentou cordialmente afastando a cadeira para me sentar.
- Olá Christian. Obrigada. És muito gentil.
- Tento estar ao nível da companhia. Correu bem a viagem?
- Muito. Um carro desses com motorista. É um luxo.
- Às vezes dá jeito. - Discretamente respondeu sem pretensiosismos
- Para impressionar as mulheres? Não resisti a perguntar quase em provocação.
- Não. De todo. Perdoa-me se ficaste com essa impressão. Era para te evitar o incómodo da deslocação e para que chegasses depressa.
- Obrigada. Foi de facto bom. E resultou... - Confessei baixinho.
- Fico feliz por ter sido do teu agrado.

Entretanto era novamente servida uma irresistível refeição.

- Não me disseste que não tinhas motorista? - Sem resistir à provocação.
- Não tenho. A empresa tem.
- Se é tua a empresa não é o mesmo?
- É bem diferente. Não tenho no meu tempo livre. Durante o dia de trabalho é frequentemente indispensável. Não posso ir buscar um cliente importante de metro embora o use para ir para casa.
- Fui tratada como importante.
- Claro. Nem podia ser de outra forma. - Pausando e olhando os meus olhos profundamente.
- É curioso teres motorista na empresa e andares de transportes, a tecnologia da mais moderna e estares sediado num edifício com mais de cem anos.
És uma pessoa de contradições. - Arrisquei insinuar só para ouvir a resposta.
- De contradições não. De contrastes. - Respondeu de imediacto.
- E é diferente?
- Muito.
- Conta melhor. - Pedi curiosa
- Contradição é não gostar de doces e comer bolos; contraste é gostar de doces e de salgados e comer ambos ao mesmo tempo.
- Respostas muito rigorosas. Espero não ter sido intrometida.
- Desafio-te a ser. - Deliberadamente provocando como quem gosta de ser colocado à prova.
- Deixa-me pensar.
- Tens todo o tempo. 
- E os lenços?

Ficou KO no primeiro assalto. Havia algo misterioso nesses acessórios. Já tinha obviamente desconfiado depois de tudo mas esse momento de silêncio e o desviar do seu olhar, como se fosse proibido, indiciava um grande segredo.
- É uma pergunta de resposta complicada.
- Desculpa. Não devia perguntar?
- Queres mesmo saber? 
- Estava curiosa. Percebi que havia algo.
- Os lenços, numa mulher interessante são eróticos. Irresistivelmente eróticos. Seduz-me num instante e gera uma infinidade de inconfessáveis desejos.
- Dito assim parece muito poderoso.
- Assim é ainda um eufemismo. - Confessou, em surdina, ao meu ouvido.

Não fico indiferente à sua proximidade embora se tivesse respeitosamente afastado no instante seguinte.
Ambos sentimos que há uma mútua vontade de dar passos maiores só limitados pela prudência e por se aproximar a hora de voltar às nossas responsabilidades. 
- Combinamos mais alguma coisa? - Não se conteve em perguntar.
- Sim. Respondi de imediacto.
- Passeamos no sábado? Posso ir buscar-te de manhã?
- Sim, sim. - Sem ter mais palavras.
- Gostas de passear bem cedo?
- Muito. Custa acordar mas vale a pena.
- Às oito estou à tua porta. Mandas-me ao teu endereço por sms? - Subtilmente pedindo todos os meus contactos enquanto colocava, na minha mão, um cartão com o seu número pessoal.
- Sim. Está bem... - Acariciando instintivamente o seu braço.

Descemos e, tal como no final almoço anterior, tinha o motorista à minha espera para me levar. Corro o risco de me habituar a isto.
Despedimos-mos com dois lentos beijinhos.
- Ana... - Hesitante balbuciou
- Sim? - A palavra que mais usei hoje. Será indicação do subconsciente?
- No sábado vamos em descapotável... - Indicou inesperadamente atrapalhado como se faltasse algo.
- Está bem. - Sem perceber a razão deste súbito embaraço.
- Protege o cabelo. Até sábado.
- Até sábado. - Igualmente respondi.

A minha cabeça estava como numa tempestade tropical. A confusão total. Os avisos da Eduarda para ter cuidado, os seus segredos, toda a sua riqueza e poder de um mundo a que não pertenço e finalmente esta enigmática mensagem, dentro de uma descontextualizada timidez que contraria a sua confiante postura.
Apesar de tudo, neste momento, desejo a sua companhia e anseio pela manhã de sábado.
Não me sai da cabeça a sua repentina hesitação para avisar que íamos de descapotável e para proteger o cabelo. Seria outro mistério como os lenços?
Seria o mistério dos lenços novamente?
Será assim tão óbvio? Agora que tudo se conjuga.
Teria sugerido, muito disfarçadamente, para que eu usasse um lenço a proteger o cabelo? Um lenço na cabeça!
Chega a manhã de sábado. Acordo cedo para me preparar. Não o quero deixar à espera. Sei que atribui importância à pontualidade. 
Depois de toda preparada só falta por o lenço. Como se põe um lenço na cabeça para andar de descapotável?
Amarro debaixo do queixo mas fica muito velhinha. Não é suficientemente grande para por à Grace Kelly. Tento estilo pirata. É engraçado mas sinto-me um pouco "street". Volto a atar mas desta na nuca, sob o cabelo, com a ponta solta, num estilo mais praia ou camponesa. Componho com os óculos de sol. Até ficou giro. Sinto-me bem. Está decidido e não posso ficar a fazer mais experiências que Christian já deve estar à espera.
Desço apressadamente e, como combinado, lá estava serenamente à espera no seu descapotável.
- Bom dia, Christian. - Rapidamente cumprimentei.
- Bom dia Ana. - Respondendo com um indisfarçável sorriso de "orelha a orelha".
- Perdoa-me ter te deixado à espera. Estava a proteger o cabelo para o descapotável - Usando palavras suas.
- Não te preocupes. Valeu cada segundo. Estás espectacular. - Pousando o seu intenso olhar sobre o meu cabelo.

Arrancamos para uma demorada viagem, por estradas secundárias sombreadas, rodeadas por grandes copas, até a um peculiar miradouro, sobre um grande granito no meio de nada, com uma magnífica vista sobre um vale e o fresco som de uma pequena nascente ao fundo. O único vestígio de civilização é uma casa grande que se avista ao longe.
- Estou impressionada - Escapou-me espontaneamente
- É justo. Assim fica mais equilibrado. - Olhando descaradamente para mim e para o lenço da cabeça.
- Tens mais surpresas destas?
- Claro. Achas que ficaria apenas por aqui? - Questionou confiante.
- Não sei. - Sem confessar o que pensava nem o que desejava.
- Vamos à nascente. Aqui ao pé. - Dando-me a mão como se indicasse a direcção.
- É tão especial como o miradouro?
- Mais. É uma nascente com duas bicas. Foi amaldiçoada por Cupido: sempre que duas pessoas bebem sua água simultaneamente apaixonam-se. - Provocou com segundas intenções

Chegados à peculiar nascente, após um curto caminho de calçada, era inevitável provar a tentadora água cristalina.
Baixamo-nos para chegar às bicas
- Ao mesmo tempo. - Pediu sedutor.
- Está bem. - Respondi mais que seduzida.

Já não seria a frescura da água que nos arrefeceria.

- Que tal? - Perguntou ainda enquanto escorria a água que pingava pelo seu queixo.
- Tão fresca! É uma lenda local a maldição do cupido? - Inquiri curiosa e com vontade abordar o tema.
- Não. Fui eu que inventei. Resultou? - Com o sorriso de quem acabou de fazer uma marotice.
- Sim... - Olhando nos olhos e entregando-me à sua vontade.

Aproximamo-nos suavemente sem mais hesitações e chocam os nossos lábios num inflamado beijo. Cedemos incondicionalmente aos nossos desejos soltando o nosso instinto mais animal. Exploramos-mos mutuamente sem deixar nada por tocar.
Embora completamente sós há um desconforto em dar o derradeiro passo. Christian apercebe-se e também o sente.
- Vem comigo - Dando-me a sua mão.

Corremos para o carro e arrancou de imediacto. Ajeito, com dificuldade, a blusa e o lenço da cabeça, já no carro em andamento.
Em poucos minutos de aceleradas curvas chegamos a uma casa grande depois de passar uns pesados portões, de escuro ferro forjado, que se abrem à nossa passagem.
Entramos numa garagem, sob a casa, de portões também abertos.
Por uma escada antiga, de madeira, inclinada, mal iluminada e apertada, após três lances chegamos a um pequeno hall que dá acesso a um espaçoso quarto. Fechadas as portas deixamos de nos impor limites. Quase arrancamos as nossas roupas na urgência de encontrar os nossos corpos.
Tudo desaparece imersos num ofuscante e intenso prazer. Só o esgotamento nos acalmou, envolvidos em silenciosa paz. Lado a lado, a olhar para um antigo lustre, que do tecto nos ilumina, respiramos lenta e profundamente.
Aos poucos, enquanto recuperamos o fôlego, observo o que me rodeia. Este quarto antigo, de mobília simples da época, perfeitamente arrumado e muito acolhedor.
- É muito bonito. Onde estamos?
- Descobri esta casa em total abandono e comecei a pensar comprar para restaurar. Comprei como estava, incluindo o recheio e passaram dois anos até tudo ficar pronto. Vou mostrar-te. - Enquanto colocava um suave robe sobre mim.

Abriu as portadas descobrindo a deslumbrante vista sobre o verdejante vale. Ao longe era visível o miradouro.
- Isto é lindo. - Cometei maravilhada.
- Foi um privilégio ter tido a oportunidade de ficar com isto.
- Aquele é o miradouro onde estivemos? - Reconhecendo com facilidade.
- És observadora. Tenho de ter cuidado. - Em tom e gozo.
- Observadora mas não represento perigo.

Voltamos para o quarto onde calmamente nos vestimos.
- Levo o lenço? - Perguntei num tom mais de brincadeira que de provocação.
- Leva. Ficas tão sensual. - Observando despreocupado.

Desta atei o lenço no pescoço, justo, com o nó para o lado.
Partimos para percorrer parte da casa, requintadamente restaurada, com uma confortável e simples decoração enquadrada na sua época.

Ficava uma sensação de mistério ao passar por diversos corredores interiores tão estreitos como mal iluminados.
- Perdia-me aqui dentro.
- É um pouco confusa inicialmente. Não gostas?
- Como se pode não gostar? É linda.

Saímos para os jardins, de sebes altas, milimetricamente cuidadas, entre caminhos e pequenos relvados.
A cada canto escondido parávamos aproveitando o momento para trocar carícias como namorados secretos.
Já mais que perdida dou por nós a chegar ao alpendre, na frente da casa, onde diversas portas abertas dão para uma grande sala. Aos meus olhos esta casa é um palácio. 
Do lado oposto, para onde passámos, uma sala de jantar já com a mesa posta.

- Almoçamos? - Sugeriu ciente da minha surpresa.
- Sim. - Esfomeada concordei no mesmo instante.
- Óptimo. - Afastando a cadeira para me indicar o lugar na mesa.
- Pensava que estávamos sós.
- É como se estivéssemos. O staff é totalmente discreto e virtualmente invisível. Faz parte da sua selecção e contrato.
- Para não revelar os teus segredos? - A ver se o picava.
- Eu sirvo-te. - Sem me responder à provocação.

O risco de me habituar a isto era assustadoramente real. O almoço estava, como sempre, delicioso.

- Não me respondeste ao que perguntei. Fui inconveniente?
- Não. Foi apenas a fome que me distraiu. E só tenho um segredo. Olhando para o lenço atado no meu pescoço. 
- Seduz-te assim tanto? - Sem resistir a passar as mãos pelas pontas do lenço.
- Nem imaginas quanto.
- Tenho poucos. Raramente uso. Mas posso usar para ti.
- Eu ofereço-te para possas combinar com toda a roupa.
- Assim uso mais vezes. E fico a conhecer melhor o teu segredo.
- A primeira metade... - Disse baixo
- Há outra metade?
- Sim.
- Afinal tens outro segredo.
- Não tenho. É mesmo outra parte do mesmo. – Enigmático respondeu.
- E vais me contar?
- Mais tarde conto. Quando sentir que estás preparada.
- Prometes?
- Sim. Prometo.

Terminado o almoço saímos para o generoso alpendre de onde se podia apreciar os jardins, resguardados do sol.
Confortavelmente sentados deixamos-nos ficar numa longa e descontraída conversa.

- Queres conhecer outros jardins? - Subitamente perguntou.
- Outros! Há ainda mais?
- Não. É apenas outra forma. - Sendo deliberadamente omisso.
- Vamos. - Sem saber ao que ia.

Levantamos-nos lenta e preguiçosamente. Andamos pouco até passar as primeiras sebes. Paramos frente a frente.
Colocou a mão no meu pescoço, sobre o lenço.
- Deixas-me completamente louco assim de lenço. Fazes voar a minha imaginação e ter vontade de ser mais pecaminoso.
- Quem te impede? - Atirando mais lenha para a fogueira.
- Não me provoques.
- É um aviso?
- É... - Pousando os seus dedos sobre o nó do lenço que eu estava a usar no pescoço.

Cuidadosamente desatou o nó tomando posse do lenço. Posicionou-se estrategicamente por trás de mim. Lentamente aproximou o lenço dos meus olhos e, com firmeza e precisão, atou-o deixando-me no escuro.
- Confias em mim? - Segurando a minha mão.
-Sim... - Entregando-me sem reservas.

Percorremos os caminhos ajardinados novamente, sem que eu tivesse a mínima noção por onde. Era completamente diferente. Sentia os cheiros e sons muito mais definidos. Quase ampliados. Dependia da vontade de Christian e, naquele momento, rendia-me ao seu desejo. A cada recanto as suas intensas mãos entrincheiravam-se firmemente sob a minha roupa sem que eu tivesse qualquer opção. Sentia-me perdidamente sua ao abdicar da visão. O seu desejo era indisfarçável. O meu era descontrolado. Sabia, ele, muito bem o que fazia e como me levar ao ponto de ebulição.
Encostou-me contra um muro que pelo frio parecia ser de pedra por entre os húmidos cheiros do musgo. Esquecido o protocolo possuiu-me intensamente sem restrições.
Nunca o tinha feito vendada e muito menos desta forma descoberta ao ar livre.
Finalmente compôs cuidadosamente a minha roupa e provavelmente a sua. Desatou o lenço que me vendava, ajeitou-o com uma invulgar precisão para um homem, endireitou pacientemente o meu cabelo, com os dedos e usou o lenço para o segurar, em fita.
Controlava tudo como se tivesse planeado embora sentisse uma sensação de genuína espontaneidade.
Passamos o resto da tarde serenamente. 
Mais tarde jantamos numa simples tasca da vila próxima. 
- Queres ficar para amanhã? - Docemente convidou
- Ainda não. Perdoa-me - Declinei ainda hesitante e insegura.

Tudo fora demasiado rápido. Demasiado bom também mas quero ter os pés na terra.
Necessito do domingo para me organizar. Nada disto fora planeado.
- Não faz mal. Desde que seja possível estarmos juntos durante a semana.
- Claro que sim. Eu quero. - Beijando docemente os seus lábios.

Voltamos para a cidade. Era fresca a noite e inibia a vontade de andar descapotável. O regresso, no carro fechado, foi rápido. Ainda atordoada pelo desenrolar dos acontecimentos.
Deixou-me em casa despedindo-se carinhosamente.
Durante a semana encontramo-nos diversas vezes. Sempre intenso embora sem ser escaldante. Os nossos laços consolidam-se fortemente. 
Sexta-feira tenho um misterioso embrulho entregue no meu escritório. Uma curta mensagem:
"Abre só em casa. Vou buscar-te às sete"
Cumpri a sua ordem com rigor.
Cheguei cedo a casa.
Mais cedo que é meu hábito. Uma miudinha ansiedade atrás de uma enorme curiosidade deixava-me desconcentrada. Mais valia ir logo para casa. 
Abri cuidadosamente o embrulho. Continha uma colecção de doze luxuosos lenços de seda-algodão Anne Tourraine Paris. Médios com diversas cores e minuciosos padrões. Eram lindos e suaves. Tinha agora lenços que provavelmente combinariam com qualquer roupa. Era obviamente propositado. Christian sugeriu, deste discreto modo, que usasse um lenço quando me viesse buscar.
Blusa branca simples destaca o lenço, calças de ganga e um casaco de malha preto.
Só faltava escolher o lenço. Todos tinham apontamentos de preto no padrão. Tudo condiz mas só levo um. Optei por um azul médio. Dá com as calças. Falta-me prática com este acessório. Optei por dobrar em fita e usar no pescoço. Dá-me conforto e é apropriado para ir jantar. Depois de diversas tentativas de nós, pouco felizes, acabei por usar com o nó para trás e uma pequena folga descaindo descontraidamente à frente.
Instantes depois recebo o SMS avisando que estava a chegar.
No seu melhor estilo já se encontrava à minha espera.
- Estás deliciosa. - Comentou mal me viu.
- Olá. Obrigada.

Envolvemos-nos num breve mas apertado abraço onde se encontraram os nossos lábios.
Seguimos para jantar. 
Como sempre encontra um reservado restaurante onde somos atendidos com total discrição e servidos de uma divinal ementa.
- Tens algum plano para depois do jantar? - Perguntei durante a sobremesa.
- Nada de concreto. Tens alguma ideia?
- Ainda não conheces onde moro. Queres ir lá um bocadinho? - Discretamente convidei
- Gostava muito. - Aceitou, de imediacto, entusiasmado.
- Deixas o carro no parqueamento da garagem. O teu descapotável não pode ficar ao relento.
- Casa de luxo. - Em tom de brincadeira.

Era altura de dar a conhecer a minha realidade ao Christian. 
Após terminado o jantar saímos directamente para a minha casa.
Estacionado o carro subimos no elevador de mão dada assumindo descontraidamente o nosso relacionamento.
- Entra. Fica a vontade. - Apontando ao centro da sala.
- Obrigado. - Respondeu baixinho como se estivesse num local sagrado.

Ficou uns longos segundos em silêncio, a observar, enquanto eu pendurava o casaco e a mala. Seria a primeira vez que era eu que controlava enquanto ele me seguia. 
- Gosto muito da decoração - Quebrando o silêncio sem que lhe perguntasse. 
- Obrigada. Tento ser prática e confortável. - Justificando o estilo.
- E sente-se o conforto bem como o dedo feminino.
- Anda. Eu mostro-te o resto.- Esticando a minha mão.

Não tentei, nem era possível, fazer uma visita guiada como fora na sua casa de campo. De qualquer modo, em poucos minutos, passamos pela cozinha, pela varandinha, pelo escritório, que também serve de quarto de visitas, e até pela casa de banho. Deixei o meu quarto propositadamente para o fim. Estava ligeiramente desarrumado. Os lenços que oferecera espalhados sobre a cómoda por terem sido escolhidos.
- Os lenços que me ofereceste. Obrigada. São lindos. - Senti necessidade de o dizer.
- Foi mesmo um prazer. - Com alguma perversidade.
- Multiplicou a minha colecção.
- Mostras-me?
- Mostro. São poucos.

Retirei do canto e uma gaveta os poucos que tinha.
- Nem sei porque tenho estes. Nem uso.
- Mas usaste um no pescoço no dia em que nos falamos.
- É verdade. Esse raramente usava mas soube que gostavas da estética e achei que não tinha nada a perder. Não fazia ideia que era tão intenso.
- Não escondo que gosto mas a intensidade é muito confidencial. Conta-me desses.
- Começo pelo que já conheces:
É o único que pontualmente uso. É práctico e macio.
Tenho dois pesados de inverno. Usei apenas durante uma viagem à Noruega.
Um muito comprido e estreito, echarpe, que comprei numa feira, por impulso e nunca cheguei a usar. Nem sequer gosto. Só não deitei fora por estar nova e não ocupar espaço para arrumar. Finalmente este vermelho, pequeno, de algodão, com cornucópias, que usei mais jovem em fita de cabelo e às vezes levo para a praia. Finalmente tenho uma colecção de doze lenços de marca que pretendo usar com mais regularidade.
- Obrigado por me contares com esse detalhe. - Abraçando-me docemente.

Esta descrição teve um erótico efeito no Christian. O seu toque estava mais atrevido, mais explorador, mais indiscreto.

- Faltam os que me ofereceste. E se eu os experimentasse. - Sabendo que o provocaria mais ainda.
- Gostaria muito. - Respondendo baixinho.

Peguei nos lenços e pousei-os sobre a cama.
Escolhi um, dobrei em triângulo e depois em fita. Atei simplesmente no pescoço, com nó à frente sob o seu muito atento olhar. 
Peguei noutro, sem me preocupar com cores, dobrei do mesmo modo e pousei.
Desatei lentamente o que tinha no pescoço e afastei-o. Atei como fita no cabelo.
O seguinte voltei a preparar a fita e atei num rabo-de-cavalo. Desatei o anterior juntando ao que afastara antes.
Dobro mais um e ato no pescoço de nó para trás. Desato o rabo-de-cavalo. Com outro dobro em triângulo e ato sobre o cabelo de nó atrás e desato o do pescoço. 
Tanto a sua expressão corporal com o seu profundo olhar denunciavam a sua excitação.
Todos os doze lenços foram experimentados de diferentes formas terminando com um lenço em fita sobre a testa estilo tenista. O efeito que lhe provocava era delicioso.
- E a segunda parte do teu segredo? - Perguntei, fora de contexto, aproveitando o seu estado, para satisfazer a minha ansiosa curiosidade.
- Estás preparada para saber? 
- Estou. Claro. Achas que estou?
- Estás.
- Conta. - Pedi baixinho junto ao seu ouvido.

Olhou para o lado e puxou a comprida e estreita echarpe.
- Posso usar como quiser? Sem medo de estragar? - Pedindo autorização.
- Sim... - Quase insegura.
- A segunda parte do meu segredo é a scarf bondage. Sabes o que é?
- Não sei. Contas-me?
- É o acto de dominar usando lenços. É eficaz e, ao mesmo tempo, suave. 

Pegou docemente no meu pulso esquerdo e passou a echarpe num rigoroso nó de duas voltas, justo e firme mas perfeitamente confortável.
- Continuo? - Olhando-me nos olhos.

Em silêncio confirmo um sim com a cabeça.
Prontamente pega na minha mão direita e do mesmo modo ata o meu pulso no esquerdo.
Entrego-me aceitando o meu destino.
Aproveitando o lenço, que eu deixara atado sobre a testa, muito lentamente desceu-o sobre os meus olhos até me deixar na total escuridão. Desatou os botões da blusa e as molas do soutien expondo-me. Desatou uma mão para poder remover estas peças por completo e rapidamente voltou a atar. Saboreou-me demoradamente como um predador que capturou a sua presa.
Lentamente retirou toda a roupa que restava. Posicionou as minhas mãos sobre a cabeça, deitando-me sobre a cama e puxou as compridas pontas da echarpe que restavam atando ao ferro da cama. Aos poucos limitava os meus movimentos submetendo-me à sua vontade.
Explorou longamente todo o meu corpo que era agora seu. Tudo se passava sem nada ver aguçando os meus sentidos.
Sinto o seu corpo nu sobre o meu sem que me tivesse apercebido que se despira. Propositadamente contraria o meu ritmo provocando o meu desejo numa clara demonstração de domínio. Leva-me ao mesmo tempo à loucura e ao incontrolável desejo.
Quando menos espero faz-me explodir sem reservas.
Não sei se ele também chegou ao fim embora o tenha sentido em mim, protegido pelo latex.
Suavemente soltou os meus pulsos e desatou o lenço dos meus olhos.
- Como te sentes? - Cuidadosamente questionou.
- Preciso dizer? - De satisfeito sorriso.
- Mas quero ouvir. - No seu habitual jeito de ter tudo bem controlado.
- Foi muito intenso, ligeiramente assustador, excitante e deste-me imenso prazer - Crua e directa na resposta.
- E sentes-te preparada para entrar neste mundo?
- Não sei. Mesmo assim quero. 

Deu-me um protector beijo na testa e ficamos suavemente abraçados até adormecer.
Pela manhã teve de ir, deixando promessa de me vir buscar, para jantar, no domingo.
O sábado caseiro serviu para arrumar a casa e descansar. Aproveitei para pesquisar, na net, "scarf bondage".
Assustador inicialmente. Vejo mulheres amarradas com lenços, de pés e mãos, vendadas e amordaçadas, também com lenços. Completamente dominadas e indefesas numa submissão total. Acredito que, de alguma forma, é pacífico. Nesta suave versão de domínio não parece haver agressão ou dor embora a entrega seja completa.
Não me sai da cabeça. Confunde-me e, ao mesmo tempo, deixa-me inesperadamente curiosa pela perversidade.
Vou ao meu quarto e escolho três dos meus lenços velhos: o que usei preto com padrão colorido, o vermelho e a echarpe. Quero tentar perceber o que se sente. 
Ato o lenço preto sobre os olhos e procuro a echarpe assim vendada. Encontro-a com dificuldade e tento atar as mãos à frente mas não resulta. Sem ver é demasiado complicado. Sem desistir consigo enrolar os pulsos usando os dentes para ajudar. Está largo e a cair. Deste modo procuro o lenço vermelho. Tive de levantar um pouco a venda para o encontrar. Agarro com as mãos atadas mas não consigo dobrar em fita e ao tentar me amordaçar as mãos soltam-se da larga echarpe.
Cheia de calor e frustrada por não conseguir me atar retiro o lenço dos olhos. É muito mais complicado que antecipara. Tem de ser planeado e preparado.
Deixo para amanhã, domingo. Ainda tenho que fazer este sábado.
De manhã, logo após acordar, resolvo planear a sessão de lenços enquanto tomo o pequeno-almoço. Antes de tudo tenho de ter uma tesoura perto, no caso de conseguir atar-me bem. Vou começar pela boca que é o que menos atrapalha depois ato um lenço na testa para baixar sobre os olhos quando for altura e, finalmente ato as mãos.
Fiz a minha rotina matinal, arrumei rapidamente o quarto e parti para a experiência. Lenço vermelho dobrado em fita e apertado na minha boca. Mesmo sem sentir perigo solto um gemido. Nunca tinha tido posta uma mordaça, nem em brincadeiras. Lenço de fundo preto dobrado em larga fita ato sobre a testa, encostado às sobrancelhas, preparado para baixar. O mais complicado era atar as próprias mãos. Tentei enrolar nos pulsos mas sem sucesso. Tentei de diversas outras formas mas tudo se solta no instante seguinte. Nem quero imaginar a minha figura se alguém visse. Amordaçada, de lenço atado na testa e sem jeito nenhum a tentar prender as próprias mãos com uma echarpe. Pareço doida para descobrir o interesse da scarf bondage. Ao fim de muitas e esforçadas voltas lá consegui atar os pulsos desde que não faça muita força para soltar. Baixei o lenço sobre os olhos completando o cenário. Sentia que me soltaria no instante que quisesse.
Permaneci quieta, como se tivesse sido raptada tentando, em vão, sentir alguma emoção.
O tempo passava e a minha experiência não apresentava resultados. 
Puxando as mãos em sentidos opostos facilmente me soltei. Desatei os lenços que tinha atados sobre os olhos e boca. Desapontada por nada de bom nem de mau ter sentido. Tudo arrumei e esqueci o tema por uns momentos. 
Ao final da tarde iria conhecer a casa de Christian e ficaria para jantar.
Chegada a hora de preparar tenho a nova dúvida ao escolher a roupa: que lenço levar e como atar?
Desta optei por um dos que me foram oferecidos. Fundo rosa com pequeno padrão.
Sigo para sua casa. Indicou-me que entrasse pela garagem. Nem tive de dizer nada ao portão. Tinha me pedido a matricula e devo ter sido identificada logo na entrada.
Até me sinto importante ao passar assim. Subo ao último andar num luxoso condomínio. 
Já estava à minha espera na porta. 
Ficamos um pouco pela sala até ser indicado que o jantar estava servido. 
Discretamente chamados, de forma que quase não se apercebe que tem empregados, dirigiu-me à sala de jantar.
- Como correu a viagem de negócios?
- Bem. Embora tenha ainda muito trabalho pela frente. Mas não devo ter de voltar à Dinamarca.
- Fizeste de propósito para me deixares com saudades?
- Não foi premeditado. Ficaste?
- Fiquei.
- E que fizeste?
- Nada de especial. - Descaindo-me com um perverso sorriso e um ligeiro rubor.
- Tens mais para contar.
- Foi apenas uma curiosidade.
- Então conta-me.
- Não foi nada de especial.
- Conta. - Insistiu curioso.
- Está bem. Experimentei lenços.
- Como? - Arregalando os olhos de curiosidade.
- Vendei-me...
- Só? - Ansioso por tudo saber
- E... Na boca...- Constrangida por confessar 
- Conta-me tudo.
- E tentei prender os pulsos. Mas não consegui bem. Soltou logo.
- O que sentiste.
- Não senti muito. Foi difícil. Atrapalhei-me toda.
- E queres mesmo fazer comigo? É um mundo perverso.
- Quero. Quero conhecer esse mundo.
- Quero mostrar-te.
- Mas vais ter vontade fazer isso sempre que estejamos juntos? - Perguntei receosamente sem conseguir usar a palavra "amarrar".
- No próximo fim-de-semana mostro-te o quarto dos lenços.
- Para a semana? Inquiri sem perceber por que não hoje.
- É na casa do bosque. Não te mostrei quando lá passamos para não te assustar. - Percebendo a minha dúvida
- Agora é que me estás a assustar.
- Era por ser o primeiro dia. Não queria confessar logo o meu fetiche. Teria menos charme. O quarto não assusta.
- Fico mais descansada.
- Se não gostares paramos logo. E temos um código de emergência. Três batidas.
- Precisas fazer isso dos lenços?
- Sim, preciso.
- Sempre?
- Não. Na maioria não será.
- E fico amarrada muito tempo?
- Sim, ficas.
- E não consigo soltar?
- Só quando eu tiver vontade de o fazer. 
- Já o fizeste com outras mulheres?
- Sim
- Quantas?
- Duas.
- Duas vezes ou duas mulheres?
- Duas mulheres, diversas vezes com cada uma.
- Foram relações duradoras?
- Foram as mais duradouras que tive. Mesmo assim não foram longas. Não foi por casa dos lenços que terminaram. - Rematou.
Saber tudo isto deu-me alguma paz embora me divida entre curiosidade e a contenção.
O tema ficou reservado para outra altura enquanto aproveitamos o serão.
Durante a semana estivemos naturalmente diversas vezes juntos.
Sexta-feira, após o dia de trabalho se esgotar, veio buscar-me. Passamos por uma casa de bifanas onde rapidamente comemos ao balcão. O nosso destino era a casa do bosque. Sentia que hoje iria ao fundo do seu segredo.
- Estás pronta? - Perguntou à chegada, já dentro da garagem.
- Sim. - Hesitante respondi.

Saímos do carro e dirigimo-nos às esconsas escadas. Descemos um lace e entramos numa bem iluminada e espaçosa cave. Um grande armário de cinco portas, ao fundo da parede, que me deixa curiosa sobre o seu conteúdo. Todas as portas idênticas menos uma que, à primeira vista, aparenta ser um bom local para guardar vassouras e esfregonas.
É precisamente para essa porta que me dirige. Uma camuflada entrada que permite passagem para uma íngreme escada japonesa. Dá para um grande quarto com uma grande cama sem cabeceira, afastada da parede, uma grande cómoda, encostada à parede, um sofá e uma estante/prateleira com cinquenta divisórias, cinco de altura e dez de comprimento. Em cada prateleira está um lenço perfeitamente dobrado e arrumado.
- O que é isto? - Perguntei como reflexo.
- É o meu quarto de prazer. Onde te vais entregar a mim. Se disseres não subimos e não descemos mais aqui nem o volto a mencionar.

Em receoso silêncio confirmei ficar.
No centro do quarto um tapete redondo onde me coloca meticulosamente ao meio.
Suavemente despe-me, de cima para baixo, peça-a-peça. Abre uma gaveta da cómoda de onde retira uma caixa preta de pano com varias faixas pretas de cetim. Tem várias caixas destas, de diversas cores com as correspondentes faixas no interior.
Retira uma longa e estreita faixa e ata firmemente um pulso ao outro pela frente sobrando compridas pontas. Está justo e aperta sem incomodar. Dá uma contraditória sensação de segurança. Retira mais duas e ata individualmente cada tornozelo e seguidamente um ao outro.
O mesmo aperto com rigor científico. 
Dirige-se à estante dos lenços.
Retira um lenço preto. Dobra-o, sobre a cama, com mãos de mestre, numa perfeita fita.
Aproxima-se com o lenço à altura dos meus olhos. Denunciando a sua intenção de me vendar. Ata-o lentamente, sobre os olhos, deixando-me num forçado escuro. Mesmo sem nada ver percebo que apreciou cada movimento. Estou nas suas mãos, sujeita ao seu pérfido desejo.
Pega-me ao colo com tal segurança e suavidade que me faz sentir flutuante.
Aterra-me sentada na cama. Posiciona-me de um modo que não consigo perceber onde me situo, perdida num pequeno espaço. Deita-me e, com a mesma suavidade, levanta-me as mãos cativas acima da cabeça, flectindo pelos cotovelos, no limite do colchão. As pontas que sobram da faixa, que me prende os pulsos, lentamente puxadas e fixas algures sob a cama.
Sem parar um momento persegue o meticuloso plano.
Solta parte da faixa que me prende os pés juntos apenas para os separar. Sinto a tensão da faixa a aumentar obrigando-me expor a minha intimidade sem decoro. Lentamente ajusta as faixas até reduzir a zero toda a minha mobilidade e cerra os nós.
A meu lado percorre, lenta e levemente, todo o meu corpo, com a ponta de um dedo. Nenhum ponto é dispensado. Nem os mais sensíveis nem os mais privados. Aos poucos vou aceitando a completa entrega enquanto fico cada vez mais sensível ao seu toque. Agora que me está a fazer subir a temperatura pára demoradamente em silêncio. Não sei se me observa ou se ausenta.
Sem pedido de licença nem aviso sua língua força a entrada entre os meus lábios num profundo e aspirante beijo. Demonstrava claramente que eu era território conquistado.
Seus lábios percorrem-me sem pudor nem rota mas sou eu quem se perde. Não consigo prever onde ou quando vai parar e, com o inicial receio transformado em excitação, quero procurar seu corpo mas estou cativa dos lenços e sujeita ao seu desejo.
Sinto o seu corpo, agora despido, sobre o meu. Explora-me até me levar quase ao limite mas não me deixa conquistar. Controla meticulosamente o meu e seu descontrolos.
Não aguento mais e quebro o silêncio:
- Entra, já não aguento. Entra. - Supliquei desejosa.
- Schhh... - Pressionando suavemente os meus lábios com o que, sem ver, me parece ser o dedo polegar.

Em quase desespero tento aproximar o meu corpo ao seu mas não permitem as minhas amarras nem o lenço que me venda. Pouco mais que contorcer e desejar me é possível assim submissa.
A sua intensidade cresce. Sinto-o na forma crescente como percorre todo o meu corpo que agora colonizou.
Sua pele paira sobre a minha sentindo-o entrar tão lentamente em mim que me leva ao desespero. Quero mexer-me com toda a intensidade mas assim amarrada, sob todo o seu peso, pouco me consigo mover. Consumo todo o prazer que me permitem as apertadas manobras até que passo o ponto de não retorno e nada mais me controla o dilúvio, arrastando-o comigo, até à exaustão.
Ainda tremia o meu corpo já soltava as faixas dos pulsos e tornozelos. Docemente desatou a venda.
Colocou a minha roupa sobre a cama e vestimo-nos ao mesmo tempo.
Saímos do quarto pelos estreitos corredores e escadas como se tivesse alguma urgência de escapar do antro de pecado.
- Gostaste? - Sem rodeios perguntou.
- Sim. - Demorando a responder esgotada.
- Excitou-te? - Procurando ser mais específico e directo.
- Imenso. - Directa também

Passamos a noite juntos para serenamente aproveitarmos o sábado. 
Passei o domingo em casa. Tentava perceber o efeito daquela submissão. Era uma entrega total mas não fui a sua escrava. A contraditória sensação de estar completamente entregue à sua vontade, sem nada poder fazer ou ver e toda a iniciativa de dar prazer ser sua. Quem seria o escravo naquela situação?

Nas duas semanas que se seguiram encontramos-mos frequentemente sem grandes criatividades. É certo que me ofereceu mais alguns lenços, que tenho usado, o que, entre nós, é recheado de erotismo. Mantivemo-nos mais moderados embora aumentasse a frequência em que passamos a noite juntos.
Como acontece, pontualmente, Christian passou uma semana no estrangeiro, em negócios. A distância aumentou o desejo. Nas últimas vezes que nos falamos inflamamos o Skype. 
Até que na sexta recebo uma encomenda com enigmáticas instruções. Um lenço médio, azul-escuro de minucioso padrão preto, um pequeno lenço de leve algodão preto e uns grandes óculos de sol Gucci, pretos também, de lentes bem escuras. Adicionou uma nota com uma curta mensagem onde apenas indicava vir buscar-me de descapotável, sábado, de manhã. O enigma era como usar os lenços. Devia vir em brasa.
Sexta, já tarde, recebi um SMS indicando que me vinha buscar às nove. 
Com antecedência preparei-me. Dobrei o lenço médio em triângulo e atei na cabeça. Não era difícil perceber que seria para combinar com os óculos de sol quando avisou vir de descapotável. O lenço preto menor é que não era assim tão óbvio. Sem saber ato na alça da carteira. Pelo menos ficava visível e à mão.
Avisou que chegara.
Desci discretamente pela escada. Não me importo nada de usar um lenço na cabeça quando estamos sós mas seria um pouco desconfortável cruzar com vizinhos no elevador.
Com a porta do carro já aberta entrei rapidamente, cruzando nossos lábios como se anos tivessem passado.
- Decifrei bem o enigma?
- Foste perfeita.
- E o segundo lenço? - Perguntei curiosa.
- Está óptimo na alça. Já mostro.

Arrancamos de imediacto. Pouco depois estacionamos nas traseiras de uma estação de serviço e fica a olhar fixamente para mim.
- Então? - Tive de perguntar
- Não te movas. - Retirando-me os óculos de sol.

Fiquei obedientemente quieta. 
Baixou o lenço da cabeça para trás, ficando caído à volta do pescoço. Calmamente desatou o lenço preto da alça. Nesse momento percebi como ia usar esse lenço. Atou-o sobre os meus olhos, recolocou os meus óculos de sol, deliberadamente grandes para disfarçar a venda e, finalmente repôs o lenço da cabeça puxando-o para cima.
Demoradamente retocou todo o conjunto até ficar perfeitamente confortável e, principalmente, a venda indetectável.
- Vamos.

Novamente arrancou para destino incerto. Segui sem ter a noção nem de onde estava nem do destino.
Conversava como se fosse a viagem mais normal. Um nervoso miudinho acompanhou-me durante todo o tempo do longo percurso. Não era receio. Sempre senti poder confiar no Christian. Ser levada vendada para local desconhecido oferece uma inquietante curiosidade.
- Chegamos. - Após travar com alguma brusquidão.
- Assim? - Instintivamente questionei referindo-me a estar vendada.
- Não tires nada. - No mesmo instante ordenou.

Saiu do carro, abriu a minha porta ajudou-me a sair e levou-me no seu braço.
Não fazia ideia de onde estava. Entramos num recinto, numa casa, nalgum local que desconheço. Senti-o a trancar a porta do quarto. Despiu-me lentamente, retirou-me os óculos de sol que apenas serviram para esconder o lenço que me vendava. Sentia que observava e consumia cada momento.
Abriu sonoramente uma cama atirando as mantas para o chão. Deitou-me, de barriga para baixo, sobre os acetinados lençóis. Com uma das suas faixas atou-me firmemente as mãos atrás das costas e em seguida os pés. Estava novamente indefesa, nas suas mãos submissa. 
Afastou-se em silêncio deixando-me perceber quão presa estava. Só me restava esperar pelo seu desejo quando sinto uma outra faixa a atar as mãos aos pés já atados. Quando penso já estar totalmente dominada há mais qualquer coisa a me prender.
- Agora que estás bem amarrada só falta um lenço. - Provocou intencionalmente.

Pouco tempo tive para perceber para onde iria esse último lenço. Temi não estar preparada para o que lhe faltava controlar e quando o deduzi já o lenço estava a ser amarrado por entre os meus dentes. Estava impotente perante a sua vontade. 
Era a primeira vez que me amordaçava. Embora justo não seria difícil retirar nem impedia totalmente a fala mas criava uma intensa sensação de submissão. Um sabor agridoce entre a clausura dos lenços e uma perversa excitação enquanto esperava a sua sentença.
Despida de roupa e de escolhas restava-me sujeitar à minuciosa exploração pelos seus dedos e lábios. Todo o meu corpo era repetidamente percorrido.
Seu corpo também despido encosta-se ao meu a roçar-se como um gato. Aos poucos posiciona-se subtilmente deitando-se de barriga para cima, joelhos flectidos e afastados. Mantinha-me deitada de barriga para baixo com as mãos puxadas para trás atadas justas e aos pés, posicionando-me com a cabeça encaixada entre suas pernas, ficando com o queixo encostado à dureza da sua excitação.
Suavemente desceu o lenço que me tapava a boca para o pescoço. Segurou, com as duas mãos, a minha cabeça numa rota cuidadosamente percorrida até ao fundo da boca. Ainda não o tinha provado assim. Nunca o fizera antes. Deixei-me assim ficar, respirando com algum aperto, apenas pelo nariz. Receava tanto me engasgar como o magoar com os dentes. Era a sensação da plena submissão. 
Controlava-me, para não se descontrolar, pressionando as coxas sobre a minha cabeça. Não deixava terminar rapidamente.
Estava rendida ao facto que, naquele instante, eu era propriedade do seu desejo. 
Vivia o momento como se nada mais houvesse, como se passasse a um universo paralelo. Privada da visão e do movimento só me era permitido provar a sua excitação, no ritmo que me impunha.
O lenço que usara na cabeça cai sobre seu corpo quando folgou as suas pernas para que eu respirasse fundo cobrindo-o entre as virilhas.
- Caiu! - Sussurrei quase como desculpa para uma pausa.
- Resolve. - Sem mais palavras claramente demonstrando o seu domínio.

Com os dentes agarrei o lenço caído afastando-o esforçadamente para o lado. Abri um pouco a boca para o aceitar novamente entre os lábios aproveitando para respirar fundo.
Reentrou cuidadosamente enquanto me trancava entre suas pernas.
Não sabia de gostava de assim estar mas não tenho dúvidas que me excita cada célula do meu corpo.
Percebo que escorrem pingos de suor pela minha cara mas pouco os sinto. 
O esforço físico é intenso e não tenho forma de o deter. Só quando estiver plenamente satisfeito me dará tréguas. Procuro dar-lhe prazer, de qualquer forma, dentro dos estreitos limites do meu confinamento, para que atinja o seu limite enquanto ele procura não se descontrolar. Transformado num injusto duelo em que ambos lutamos pelo controlo do seu prazer.
Subitamente afasta-me e recoloca, entre os meus dentes, o lenço com que estive amordaçada, 
Afasta-se ofegante. Também o estou. Estava à beira do descontrolo e, só assim, evitara perder.
Após uns minutos de recobro desata lentamente o lenço da boca preparando-me para a derradeira etapa. Seguro-o, mordendo por uns segundos, para que dificultar a sua remoção. Mais que me impedir que fale o lenço protege-me da sua investida. Aproveitei esta réstia de controlo mas rapidamente cedi. Inspiro profundamente preparando-me para a imersão entre as suas coxas.
Posiciona-me, encosta, nos meus lábios a sua hirta ponta, afasta as suas coxas e puxa-me para si. Mal recuperados reacendemos a batalha em que as minhas únicas armas são os frágeis lábios e língua contra as suas poderosas coxas. 
Repetem-se os movimentos, os apertos e os gemidos. Luto para lhe conquistar a satisfação e para respirar nos espaços. Controla-se travando-me com as coxas até, finalmente, passar o ponto de não retorno.
Afasta totalmente as coxas permitindo-me livre-trânsito. Agora vou até ao fim.
Finalmente derrotado Christian sinto a pressão do seu jacto mas nem sinto sabor. 
Ambos caídos ofegantes e imóveis sobre a cama até que carinhosamente me desata os pés, seguidamente as mãos e, com uma toalha húmida, limpa meus lábios. Deixa-me intencionalmente vendada. Questiono-me se ainda não era o fim.
Ficamos novamente deitados até estarmos bem recuperados.
- Estas bem? - Questionou preocupado.
- Sim... - Minimamente respondi

Calmamente vestiu-me e vestiu-se também.

- E o lenço dos olhos não te esqueceste?
- Não. Fica assim só mais um pouco.

Voltou a colocar-me os óculos de sol e suavemente atou o lenço da cabeça.
- Vamos. - Avisou calmamente.
- Assim. - Estranhando ir vendada depois da sua satisfação.
- Quero que este local continue secreto e misterioso para ti. - Brevemente clarificou.

Carinhosamente deu o seu braço e saímos bem aconchegados. Abriu a porta do carro e guiou-me para o assento fechando a porta em seguida.
Seguimos viagem e, passado algum tempo, abrandou para abrir a capota.
- Podes tirar a venda
- Finalmente. - Em tom de brincadeira.

Retirei o lenço da cabeça os óculos de sol e o lenço que me vendava. Recoloquei os óculos imediatamente porque a luz parece mais intensa depois de tanto tempo ser ver.
Ajeitei o cabelo algo desgrenhado e aproveitei o lenço, que usara na cabeça, para fazer uma fita, de forma a por alguma ordem.
Embora completamente perdida por ter estado vendada sabia estar no litoral. Ver o mar dava uma pista que não deixava muitas dúvidas.
Como já me habituou almoçamos num discreto e acolhedor restaurante, com vista sobre o mar e onde tem um especial tratamento.
- Conheces todos os restaurantes deste tipo? - Inquiri curiosa.
- Só os reles - Ironizou de imediato.
- Adorei.
- Ainda bem. Tinha essa expectativa. E hoje? O que achaste? - Cautelosamente aproveitou para questionar.
- Gostei... Foi diferente, misterioso, por vezes assustador, até desconfortável e esgotante mas foi muito intenso e excitante. - Prudentemente respondi.
- Não foi demasiado ambicioso?
- Foi muito mas não demasiado. Foi diferente.
- Repetias?
- ...Sim. Desde que não seja para breve. - Hesitantemente respondi.
- Não me pareceste convicta. Porquê?
- Foi muito forte. Fiquei esgotada.
- Tiveste medo.
- Tive. 
- E gostaste de ter medo?
- Mas alguém gosta de ter medo? - Esquivando-me à resposta.
- Quem vai às montanhas-russas gosta.
- Eu gosto de montanhas-russas... - Admiti com receio

Até no descontrolo Christian controla os detalhes, tentando perceber até onde pode ir. 
Já me levou até onde nunca imaginei ser possível e não me parece que tenha chegado ao limite. 
Após o almoço, na volta, prescindiu do lenço que me vendara permitindo-me desfrutar da pitoresca estrada sobre o litoral.
Passamos o resto do fim-de-semana em sossego. Domingo, ao início da tarde deixou-me na minha casa.
Despedimos-nos longamente por Christian ter iniciar uma sequência de viagens a diversos países. Estaríamos afastados durante algum tempo.
O fim-de-semana fora maravilhoso. Sinto que já me faz falta estar com Christian todos os dias. O seu olhar, a sua voz, a atenção que me dedica, o cuidado com que me trata, o seu gosto e interesse pelas coisas simples, a sua conversa que escorre sobre tudo e acima de tudo o seu doce beijo e carinhoso toque.
Até a sua perversão, que racionalmente poderia parecer incómoda, leva-me a níveis de excitação difíceis de explicar. Nesses momentos o seu libido é astronómico e, em troca da minha liberdade, possui-me com todo o seu inesgotável desejo, uma profunda atenção e uma sensual perversão.
Passamos a semana distantes. Apenas a tecnologia nos permite uma falsa sensação de proximidade.
Na quinta-feira de manhã sou avisada pela portaria do escritório que tenho uma encomenda para assinar. Um pacote grande mas sem ser pesado. No escritório desembalo calmamente. Uma sofisticada mala de cabine Samsonite. 
Assim, sem mais nada, deixa-me confusa. 
Abro mala e dentro de um envelope almofadado, que tem manuscrito, por fora, a marcador "Vem jantar comigo amanhã", encontrava-se um lenço de seda, médio/grande, em tons de azul. 
Abri o envelope. Retiro uma página impressa com um checkin online, no meu nome, para amanhã, sexta-feira, às sete de tarde. Destino: Paris - Charles de Gaulle.
Levo uns momentos até ter a certeza que é o que parece, embora óbvio.
Convidou-me para jantar em Paris como se fosse uma ida às bifanas. 
Amanhã terei de me apressar. 
Chegada a casa revi os documentos. Só então me apercebi que voltaria domingo à tarde. Duas noites.
Arrumei a mala nova e deixei à porta pronta. Coloquei mais uns lenços. Merece.
Vou ter de a levar para o emprego de modo a ter tempo para sair directamente para o aeroporto.
Felizmente sexta-feira fora um dia tranquilo no escritório. Apanhei um táxi para o aeroporto, e o voo saiu a horas.
A meio da viagem lembrei-me de colocar o lenço, que me oferecera com a mala, no pescoço. De certeza que imagina que usarei. Eu quero tanto que goste.
Nada mais combinamos. Não sei que me espera à chegada. 
Após aterrar, como não tinha bagagem de porão saí rapidamente. Apressei-me por ter saudades e saber que, contando com a diferença horária, estava a ficar tarde para jantar.
Nas chegadas vejo logo um grande cartaz A3, com o meu nome escrito. Lá estava Christian à minha espera. 
- Estás linda. - Disse logo mal me viu de lenço.
- Estavas com medo que não te visse? - Referindo-me ao cartaz
- Estava. Por isso te enviei o lenço para te reconhecer mais facilmente. - Num muito irónico tom sério.
- Sabes que és louco?
- Não contes a ninguém. 

Saímos de seguida. Dirigimo-nos para norte, afastando-nos ainda mais de Paris, para pararmos num simpático bistro, dentro de uma igualmente simpática vila.
Entramos naquele acolhedor ambiente onde nos é servido um jantar quase caseiro.
- Até aqui conheces restaurantes destes! - Surpresa comentei.
- Gosto de estar informado. - Com um subtil sorriso rematou.

Voltamos tarde para o hotel, em Paris. Estávamos longe e não tínhamos pressa.
Adormecemos abraçados após nos amarmos simples e ternamente.
No dia seguinte, mais descansados apenas passeamos descontraidamente por Paris. Usei propositadamente um diferente lenço no pescoço durante a fresca manhã. Durante almoço e início da tarde passei o lenço para fita de cabelo sabendo perfeitamente que provocava a fera. Entretanto saboreávamos os encantos da cidade das luzes até que acenderam. O fresco voltara e o lenço recolocado no pescoço. Voltamos para o hotel onde decidimos jantar e ficar. 
Chegamos na suite muito agarrados.
- Vou tomar um banho rápido. - Indiquei logo à entrada.
- Quero que voltes vestida apenas com o lenço. - Pediu-me ao ouvido.
- Onde? - Sabendo que o provocava.
- Sobre os olhos. Só eu é que posso retirar.

Concordei acenando com a cabeça.
Após um breve e reestabelecedor duche chegou o momento. Cuidadosamente abro o lenço e faço uma fita. Olhou-me uma última vez ao espelho, despida, ato o lenço sobre os olhos e saio desorientada. A suite está em total silêncio. 
- Christian? - Chamei por reflexo.

Não há resposta. Coloco a mão sobre o lenço tentada a retirar. Sei que não posso. É mais um dos seus perversos planos.
Pelo tacto dirijo-me até à cama sabendo que o ia encontrar.
A grande suite parece maior.
De gatas palmilho toda a cama. Embora king size não é possível o perder aqui. Não devia ser... 
Não está aqui.
- Christian... - Volto a chamar baixinho

Continuo sem resposta enquanto me observa certamente.
Totalmente desorientada sujeito-me às regras do seu perverso jogo.
Não tenho alternativa senão procura-lo por toda a suite. 
De mãos à frente, cuidadosamente percorro todo o perímetro até que o meu pé pisa o que acredito ser o seu. Atabalhoadamente ajoelho-me me e agarro o seu pé. Para me certificar percorro ascendentemente as suas pernas, com as minhas mãos. 
Está igualmente despido! 
Apercebi-me quando agarrei o que não estava à espera de sentir tão sólido.
- Ai! - Inocentemente escapou-me embora não seja uma surpresa.
Sentado numa poltrona, no canto da suite dificultado propositadamente que o encontrasse foi um privilegiado voyer.
- Porque me deixaste tanto tempo à procura? 
- Porque ficas muito erótica assim exposta e perdida. Porque gosto de ver.
- Foi um show privado?
- O melhor... Vem cá. - Insinuando a sua intenção ao puxar-me para si, assim de joelhos e vendada.

Tento certificar-me, com as mãos, que estou na direcção certa.
- Não quero que uses as mãos. - Ordenou puxando-as para trás das costas e atando-as firmemente com mais um lenço.

Abro ligeiramente os lábios aceitando a submissão.
Faz-me provar todo o seu rijo volume e logo me levanta, fazendo-me sentar, encaixada em si, ainda sentado.
Não o posso ver e não imagino o que pretende ao ficar longamente imóvel como se me observasse assim. Fico tão ansiosa como receosa. Saio da realidade e deixo-me levar. 

Aos poucos sinto o seu serpentear a ganhar ritmo no meu interior.
A procura vendada apurou exponencialmente os meus sentidos. Cada movimento transmite-se a todo o corpo chegando à ponta de cada cabelo. Embora completamente no escuro sinto-me segura envolta nos seus braços e mãos, controladores do meu movimento. Lento, minucioso e premeditado, para prolongar infinitamente o momento. O seu aperto tudo controla. Da frequência do movimento até à forma como respiro entrego-me, sem alternativa, à sua vontade. O serpentear nunca pára. Vai aumentando de intensidade pouco a pouco sem nunca perder o seu azimute. O meu corpo já não me obedece. Contrai-se quando menos espero como se tivesse vontade própria. Já nem Christian me segura. Esmago-me contra o seu corpo suplicando por mais. Não sei bem que mais. Tudo mais...
Explode o meu prazer sem que seja possível abrandar. 
Christian, heroicamente, no seu precioso ritmo, mantém-se controlado. Continua, longamente, dentro de mim sem me dar tréguas. 
Quando aparenta abrandar volta a ter força renovada, até que finalmente sinto que escorre para a êxtase, quando nada mais consigo movimentar, arrasada.
Levanta-me desencaixando-se e deita-me na cama. Nem tenho força para retirar o lenço que me venda. Nem faz mal porque me quedo deitada sem mexer um músculo. Uma sedosa manta é colocada sobre mim abafando-me. No mesmo instante desligo num profundo sono.

No dia seguinte acordo com a voz de Christian, à porta da suite a receber 
o pequeno almoço. 
Abro lentamente os olhos e contemplo, primeiro, o tecto e, seguidamente, toda a requintada decoração de todo o quarto.
Com um grande tabuleiro e um controlado sorriso aproxima-se confiantemente.
- Mademoiselle. - Em propositado francês.
- Merci. - Respondi no mesmo estilo.

Crepes! Claro. Com múltiplos acompanhamentos em 
artísticos pequenos potes. Não estivéssemos nós em Paris.
Desfrutamos do conforto do hotel até à hora de sairmos para o aeroporto, de táxi. 
Temos voos diferentes. Ele ainda tem trabalho em Londres e eu volto a casa.
Chegamos com muito tempo ao Charles de Gaulle. 
- Vamos às lojas. - Sugeriu com segundas ideias.
- Vamos. - Concordei sem hesitar.

Apenas então é que me apercebi da quantidade de lenços que há nas lojas do aeroporto. São o clássico presente que pode ser usado por toda a mulher sem ter de saber o número da roupa. Estava no seu recreio.
Fez-me experimentar um sem número de lenços de toda a forma. Éramos uns meros desconhecidos sem medo de fazer figuras tristes. 
Passado algum tempo, já perto do momento de embarcar, comprou um suavíssimo lenço de pura seda, médio/grande, e no meu pescoço atou-o, após dobrar numa perfeita fita, a partir de uma primeira dobra em triângulo, com um rigoroso nó francês - duas voltas atado à frente. 
Durante o voo, sozinha, em executiva, não me saia da cabeça a sensação de montanha russa emocional.
Por um lado, sou tratada como princesa, acarinhada, sou centro da sua atenção e sinto-me amada como nunca fora, quando me submeto aos lenços desfruto de um gigantesco e descontrolado prazer erótico; por outro lado passamos muito tempo afastados por causa das suas responsabilidades.
Foi recorrente este pensamento durante todo o voo. 
De volta a casa ainda tenho tempo de me organizar um pouco antes de ir comer qualquer coisa. 
Cansada e assoberbada, com este surpreendente fim de semana, anseio pela minha cama acompanhada por um livro. 
Durante a semana, sempre que temos oportunidade, comunicamos. Diversas vezes ao dia, até.  Fico sempre com uma sensação de que fica qualquer coisa a faltar. É seguramente a sua presença física. 
Quando volta costuma vir mais "assanhado". Com maior vontade de me ver de lenço e de me dominar. Eu fico com vontade do seu contacto físico, mas não tão criativo. Christian já o percebera e tem o cuidado de não se mostrar tão dominador no dia em que chega. E até gosto de o picar usando um lenço.
Passadas duas semanas estava de volta. 
Era sexta feira. Viria buscar-me cedo, ao trabalho, para irmos jantar num daqueles restaurantes que conhece. 
Com muita ousadia e algum atrevimento arrisquei usar, na cabeça, o lenço que me oferecera em paris.
Terminadas as minhas tarefas da semana e tudo arrumado fui discretamente para a frente do espelho na instalação sanitária. Dobrei cuidadosamente o lenço em triângulo e atei sobre a cabeça, passando sob o queixo e atando atrás, estilo Grace Kelly. Completei com os meus óculos de sol, de inverno, apenas ligeiramente escurecidos.
Subitamente entra a minha colega Rita que, ao se aperceber da minha indumentária pouco comum aos dias de hoje, não resiste em comentar:
- Que estilosa!
- Obrigada. - Agradeci sem saber que mais dizer.
- O namorado vem buscar-te de descapotável? - Perguntou como se afirmasse.
- Vem. Percebe-se muito?
- Que maravilha. Pareces uma actriz num descapotável com o lenço - Suspirando entusiasmada.
- Dá jeito embora pareça antigo.
- Adoraria ter quem me levasse assim. Há mais homens assim? Como conseguiste?
- Aconteceu. Duvido que haja mais assim. É um pouco único. - Sem desvendar, obviamente, nenhum dos seus segredos.
- És uma sortuda. Vai. Não o deixes à espera. Bom fim de semana. - Concluiu sem mais conversas.
- Bom fim de semana, Rita.

Como é seu hábito já me esperava. 
- Ana.
- Christian. - Abraçando-nos fortemente e encontrando nossos lábios
- Levas tu o carro? - Convidando-me a conduzir o seu Tesla Roadster.
- Levo eu? - Espantada pelo convite.
- Sim. Se não te importares. Eu indico o caminho. Com as saudades que tinha, ao ver-te assim tão sensual, não vou conseguir tirar os olhos de ti. Seria um perigo conduzir dessa forma.
- Sabes que és maluco?
- Sei. Mas tento esconder. - Respondeu, como sempre, no momento.

Às vezes tenho dúvidas se o efeito dos lenços possa a vir nos prejudicar mas não consigo deixar de gostar do extraordinário poder de sedução que me dá. 
Saímos de seguida.
É um carrinho delicioso de se conduzir.
Jantamos, como esperado, em mais um surpreendente restaurantezinho e, sem surpresa, passamos o fim de semana juntos.
Usei lenços, todos estes dias, propositadamente. Apetecia-me provocar. Conseguiu conter-se e não os utilizou como se tentasse provar ser capaz de manter o controlo.
Domingo, quando me deixou em casa, após nos despedirmos deixou o aviso:
- No próximo fim de semana serás minha. Toda minha. - Em consequência da minha constante provocação.

Durante a semana encontramo-nos com a habitual possível regularidade sem nada falar sobre detalhes para o fim de semana. É óbvio que será envolto na sua scarf bondage. Há algum tempo que não faz nada. Não consigo deixar de ter alguma curiosidade depois de tanto espicaçar a fera.

Apenas lhe foi possível ir me buscar no sábado devido ao muito trabalho.
Cedo, muito cedo, como gostamos, veio a minha casa, para tomamos juntos o pequeno almoço. Em seguida fui acabar de me vestir sem deixar de o picar.
- Queres que use algo de especial? - Inquiri perversamente.
- Não. Tenho no carro. Trás apenas os teus óculos de sol mais escuros.

Mal entramos no carro deu-me um pequeno saco de tecido preto. Sem nada ser dito abri cuidadosamente. Dois lenços pretos. Um menor, de fino e suave algodão e outro maior, sintético, mas também suave.
- Como? - Sucintamente perguntei.
- Antes coloca os óculos de sol no colo. - Pediu baixinho.
- Sim. - Sem hesitar fiz como pediu.
- Dobra o menor em triângulo e depois em fita. O maior apenas triângulo e, para já, não faças nada mais.
- Sim. - Obediente respondi.

Dirigíamo-nos para a sua casa de campo. Desconfio, sem coragem de perguntar, que pretende levar-me para o quarto dos lenços.
Numa zona já arborizada, sem vivalma, ainda a caminho estacionou subitamente.
Retirou os óculos de sol dos meus olhos, suavemente beijou cada um, recostou-se e suspirou profundamente.
- Venda-te. - Ordenou baixinho.

Peguei no pequeno lenço, aproximei lentamente dos meus olhos e, sob o seu atento olhar, atei firmemente, selando a visão.
- Agora ata o outro lenço na cabeça.

Pelo tacto agarrei o maior lenço, coloquei sobre a cabeça,
Passei as pontas sob o queixo e atei atrás.
- Coloca os óculos para não se perceber que estás vendada. - Entregando-me na mão.

Cuidadosamente recoloquei os óculos, posicionando correctamente as hastes sobre as orelhas, por dentro do lenço da cabeça.
- Despe as cuecas sem tirares a saia. - Ordenou perversamente
- Sim. - Submissa respondi.

Colocou o meu cinto de segurança dando um propositado e dominador aperto. Ouvi-o a colocar o seu.
Arrancou energicamente para uma viagem que foi contrastantemente lenta.
O carro finalmente parou. Soltou o meu cinto de segurança e ajudou-me a sair do carro. Levou-me pela casa até, muito cuidadosamente, me guiar pelas íngremes escadas. 
Sabia ter chegado ao destino. Era evidente que estava no quarto dos lenços. Um misto de desejo e receio toma conta de mim.
Oiço a porta a trancar.
- Acho que já estás preparada para isto. - Enigmaticamente insinuou.
- Que me queres fazer? - Não consegui evitar perguntar.
- Tudo o que o meu desejo criar. 

Em pé, vendada, perdida algures pelo quarto, aguardo o meu destino.
Muito lentamente retira-me os óculos de sol. Botão a botão, em silêncio, desaperta o meu casaquinho de malha. Em seguida, precisamente do mesmo modo, desaperta a blusa. Retira-me languidamente as meias, sempre neste lento compasso. Exposta, de tronco nu sem nada ver intensifica-se a minha submissão.
Afasta-se, mantendo o silêncio. Mexe ostensivamente nas gavetas certamente procurando mais lenços que entende serem necessários.
Sinto agarrar no meu pulso direito e ser atado, firmemente, com um acetinado tecido. Pontas compridas ficam caídas. O mesmo com o meu pulso esquerdo. Em seguida os tornozelos, um de cada vez. Estou a ser preparada, mas mantenho o silêncio que se estende por todo o quarto enquanto longa e perversamente me observa, como tanto gosta.
Subitamente puxa a minha saia para baixo. Como já nada mais usava deixou-me totalmente despida, numa inesperada fracção de segundo.
 - E agora? - Tenho de perguntar.
- Agora vais ser amarrada. Totalmente amarrada. - Puxando os pulsos pelas fitas para trás das costas, prontamente rematando com um nó.
Novamente ficou em silenciosa observação.
Longos minutos passados senta-me aos pés da cama. Empurra-me suavemente para o centro, afasta as minhas pernas e estica as fitas atadas nos tornozelos amarrando nos cantos da cama. As poucos fico cada vez mais indefesa e sujeita ao seu domínio. O receio, a adrenalina e a excitação crescem em sincronia.
Volto a ouvir mexer em tecido. Que mais procurará.?
A doce suavidade da seda com que acaricia os meus lábios denuncia a sua intenção. Prolongadamente empurra o lenço, com os seus dedos, para o interior da minha boca. Com outro ata firmemente, selando os meus lábios contra qualquer protesto. Desata as minhas mãos atrás das costas e prende-as firmemente aos estremos da cabeceira da cama. Com todo o rigor ajusta todas as amarras eliminando qualquer folga ou hipótese de soltar. Nunca imaginara estar assim tão bem amarrada. Ele sabe rigorosamente que faz.
Nua, de mãos e pés firmemente atados em X na cama, vendada e amordaçada. Tudo perfeitamente apertado, mas sem ser desconfortável. 
Totalmente indefesa e entregue ao seu domínio submeto-me
Um longo e provocante silêncio faz-me antecipar muitas possibilidades.
Muito levemente os seus dedos começam a percorrer o meu corpo a partir dos pés. Passam por todo o lado até ao pescoço. Tão lenta e levemente que é o meu corpo que procura os seus dedos. Aos poucos tornam-se pesados e passa a usar as mãos completas em repetidos movimentos. Meu desejo aumenta, mas tenho a boca tão bem tapada que só o consigo demonstrar pelo movimento corporal. E com muita dificuldade, bem presa que estou.
Juntam-se os lábios em ao seu lento e repetitivo processo. Mais tarde também com a língua. Sempre percorrendo insistentemente todo o meu corpo. Desejo mais, desejo já. Preciso já mas o ritmo é o que me impõe 
Cheira-me acompanhando o seu percurso. Cheira-me e prova-me em todas as zonas sensíveis, como e quando quer, afirmando o seu domínio.
O percurso repete-se sem fim, mas a intensidade aumenta.
Cheira-me mais, prova-me e suga-me sem pausas. Sou a sua guloseima. 
Seus dedos exploram todos os meus recantos sem limites nem preconceitos.
Grito abafada pelos lenços que me enchem a boca. Quero pedir mais sem conseguir.
Luto sem sucesso com as amarras que me seguram impiedosamente.
Agora sei que nada posso fazer. Apenas sentir.
Ataca-me com a insaciável língua sem me permitir chegar ao fim. Descontrolo-me totalmente e imploro mais com as ancas num mínimo movimento que mal permitem as amarras.
Repete, insiste, mantém-me na fervura sem nunca deixar verter. Só mais um toque profundo seria mais que suficiente para o clímax. Não me permite gozar quando preciso. Apenas quando quiser numa claríssima prova do seu domínio.
Passado tanto tempo à beira da explosão em nada mais consigo pensar. Até a mente já controla. Quero, preciso, silenciada imploro, contorço-me e distorço-me. Que mais deseja? Meu reino por mais um toque.
Até que me subitamente me monta até à profundidade e cavalga-me loucamente. Tudo explode em mim. Grito num abafado gemido que os lenços na boca inibem.
O céu já não é o limite. Várias vezes o passei.
Não para nem me deixa parar. Quando sai de mim volta a língua, voltam os dedos. Não me permite desligar. Arrasa-me mesmo sabendo encharcada. Tento pedir que pare. Suplico numa inútil resistência. Perdi todo o meu controlo. Não percebo se tenho orgasmo após orgasmo ou se é contínuo. Não me dá tréguas mantendo-me no limite. Liquefaço-me descontrolada. A ditadura das amarras não me permite evitar.
Repetidamente volta a cavalgar-me, num longo e compassado galope, sem pausas, alternando entre o seu erecto volume e a irrequieta língua. Há muito que esgotei as minhas forças e continuo em êxtase até que, finalmente, o senti a escorrer dentro de mim.
Rapidamente retira os lenços da minha boca. Fico a respirar ofegante.
Com calma desata-me tudo excepto a venda. Não a consigo desatar porque me é impossível mexer um músculo. Estou completamente arrasada. Nunca imaginara ser possível excesso de prazer. Os abdominais e as coxas ainda se contraem involuntariamente.
Perdi o meu controlo. Christian concretizou a sua posse.
Após uma pausa sai do quarto dos lenços e abre torneiras.
Nada mais faz e eu nada consigo fazer para além de me quedar deitada.
Pouco depois pega-me ao colo e coloca-me na banheira.
Com uma esponja muito suave lava-me lentamente.
Reajo com gemido quando passa em zonas sensíveis, ainda ao rubro. O controlo do meu corpo não me pertence.
Após me lavar encosta-me deitada na banheira, de porta aberta enquanto o ouço a arrumar o quarto.
Ergue-me e senta-me numa cadeira. As minhas pernas ainda tremem. Com uma volumosa toalha seca-me cuidadosamente.
Retira o lenço que ainda me mantinha no escuro e aconchega-me num suavíssimo robe de pura seda.
- Como estas?
- Assustada - Foi o que me ocorreu responder.
- Assustei-te?
- Sim. Mas principalmente assustei-me a mim. Não fazia ideia que aguentava ir até onde fui.
- Vamos para o quarto. Eu ajudo-te.
- Vamos.
- Senta-te no cadeirão. - Gentilmente ajudando.
- Está tão arrumado! - Surpresa por esperar ver lenços espalhados.
- Apenas atirei tudo para um cesto.

Na mesa, ao lado do cadeirão, colocou um enorme copo de sumo de laranja.
- Bebe. Perdeste muitos líquidos.
- Está delicioso! - Após provar num grande gole.

Levei mais de uma hora para recuperar parcialmente deste desmedido esforço e reconquistar o total controlo do meu corpo.

- Agora quero saber se gostaste. 
- Acho que gostei. Nunca fui levada tão longe, nem nada se aproximou. Tive medo e vontade de te bater. Primeiro por não me deixares atingir quando queria e depois por não me deixares sair daquele estado em que não aguentava mais. Mas nunca tive nada assim.
- Sentiste quem domina.
- Sim...

Passamos o resto do dia juntos e depois de jantar levou-me a casa. Não falamos mais daquela sessão nem de nada erótico. Esgotamos as libidos até à última fracção.
No domingo não nos encontramos. Precisava mesmo de dormir muito e de ter algum tempo para mim, para arrumar e organizar.
Não me saia da cabeça tudo o que experimentei.
Aquilo é que é a bondage e o domínio.  Ficar completamente presa e indefesa, sem ver nem poder falar. Totalmente submissa e entregue à sua vontade.
Por outro lado, enquanto nada fiz nem podia tentar fazer, serviu-me prazer intenso, repetitivo, ininterrupto, esgotante e interminável.
Será que troquei a liberdade pelo prazer?
Tremo quando penso nisso.

As semanas que se seguiram não tiveram nada de inesperado para um casal de namorados. Sentia-me realmente sua namorada. Passávamos o fim de semana juntos e encontrávamos.0-nos com frequência durante a semana. Por vezes oferece-me lenços. Eu uso com mais frequência que no passado mas não o faço sempre. Perderia o especial charme.
Há um conjunto de desconfortos que me deixam inquieta: a montanha russa emocional que é estar  o topo quando estamos juntos e em baixo quando frequentemente separados pelas suas inúmeras viagens; a total submissão e o prazer extremo; um mundo que temo se desmoronar por não ser o meu e a incerteza permanente de não saber se o acessório que me complementa é o lenço ou se serei eu o acessório dos lenços.
Nem posso falar disto com alguém que me ouça e aconselhe sem expor o seu segredo, que prometi nunca contar.
Não quero deixar a minha empresa para o acompanhar sempre. Depois de tudo o que trabalhei, para chegar a onde estamos, largar tudo para ficar dependente seria frustrante. Seguramente ficaria com a sensação de muleta se o fizesse.
Para lá das inseguranças as semanas passavam, com trabalho e encontros, aproveitando todo o tempo livre para estarmos juntos. E esse tempo é quase perfeito.
Olho para os lenços de forma completamente diferente. Na verdade, gosto do pequeno acessório. Gosto da versatilidade, gosto do conforto e gosto da sua diversidade decorativa. Adoro o imediato poder de sedução que me dá. E, de uma inesperada forma, gosto da sua scarf bondage: a entrega total em que tudo recebo, ser levada para além do limite que desconhecia ser tão grande e até do medo que provoca.
Chegamos a estar quatro ou cinco semanas sem me levar ao quarto dos lenços. Fica sempre o receio por estar completamente indefesa embora tenhamos estabelecido um código de emergência: quatro batidas seguidas.
Cheguei a pedir-lhe para me raptar no quarto. No final de uma semana, de mau tempo, em que perdemos dois clientes, tive uma inundação e outras pequenas chatices diárias que me fizeram acumular demasiada pressão, fiz-lhe o inesperado pedido. Necessitava ter uns momentos de ausência num dia em só me apetecia gritar. Já lhe tinha dito quando falamos por telefone e ficamos de nos encontrar no final do dia.
"Estou pronta para ser raptada." - Enviei-lhe, mais tarde, por SMS.
"19:00. Prepara-te" - Respondeu curto pelo mesmo meio.
Como combinado pontualmente chegou a minha casa para me levar.
Fui de lenço na cabeça, preso atrás, em plena consciência de estar a ser incendiaria expectante pelas "severas" consequências.
A chegada em nada denunciava os seus planos.
Um simples lanche ajantarado nos esperava no alpendre.
Rapidamente comemos sem qualquer referência ao que viria.
- Vamos por algo mais confortável. - Levantando-se e dirigindo-me para a suite.

Sobre a cama esta uma camisa da noite muito direita. 
- Só quero que a vistas. Rigorosamente nada mais. - Abrindo a porta da casa de banho da suite.

Preparei-me calmamente apesar da ansiedade.
Finalmente desato o lenço que ainda usava no cabelo. Não tenho a certeza mas foi tão claro ao indicar nada mais que a camisa de noite. 
Levo o lenço na mão.
Ao sair tenho umas pantufas meticulosamente paralelas à espera.
- Estás pronta para mim. - Pegando no lenço que eu segurava na mão. 

Rapidamente dobra, em fita, e venda-me no mesmo instante. 
Vai começar! Sinto o coração a disparar.
As minhas mãos são suavemente atadas á frente.
Assim, como condenada, leva-me para a sua masmorra dos lenços.
Ao chegar deixa-me parada, de pé, exposta ao seu olhar, como gosta, enquanto vai escolher os lenços que me que me farão cativa. Propositadamente demora. Tremo tão ansiosa como receosa. 
Empurra-me para a cama ficando deitada de barriga para baixo e mãos acima da cabeça. Ajusta a fita que me amarra as mãos e prende-as juntas na cabeceira da cama deixando os braços esticados. Sinto toda a sensação de estar a ceder o controlo e ficar indefesa.
Com autoridade enfia-me um lenço na boca. Entra até quase engasgar. Rapidamente outro lenço aperta entre os lábios impedindo-me de empurrar o enfiado para fora cerrando-me num abafado silêncio.  
Afasta-me as pernas, sem pudor, amarrado cada tornozelo aos cantos da cama. Estica e ajusta milimetricamente e sem vestígios de folgas, como é seu modo.
Nunca me deixara assim de barriga para baixo. A mordaça parece especialmente forte desta feita. Instintivamente resisto e luto contra as firmes fitas que me amarram.
As suas quentes mãos, pesada e lentamente, iniciam a exploração do corpo que era meu mas que agora lhe pertence.
Nada posso fazer, ver ou dizer. Resta-me render completamente ao seu desígnio.
Pára sem aviso. Ouço-o a procurar qualquer coisa.
Seus passos embora suaves denunciam a sua proximidade. 
Não me consigo aperceber do que está a fazer, mas esta posição deixa-me apreensiva.
Subitamente sinto algo frio entre as nádegas. Mesmo muito frio. Apercebo-me que lentamente me passa um gel frigidíssimo por todo o meu inocente rabinho. 
Não estou preparada para isso! Gemo, protesto, puxo pelas amarras, mas nada me dá folga. Energicamente levanto e baixo os quadris batendo sonoramente no colchão para demonstrar o meu protesto e fugir daquele dedo oportunista.
Mais o excita. A ponta do dedo ilegalmente encostada no meu ânus pronta para arrombar a porta fechada. Por mais tente os meus limitados movimentos são insuficientes para escapar. Aperto o esfíncter, no limite da minha força e consigo impedir o dedo de entrar. Mantém-me propositadamente assim, nem folga nem aumenta a pressão.
Demonstra quem domina e quem se submete.
Sem aviso retira o dedo e desata as minhas pernas. Roda-me energicamente deixando-me de barriga para cima, de mãos na mesma atadas juntas sobre a cabeça e, num instante, volta a atar os meus tornozelos aos cantos da cama, com as pernas bem afastadas, expondo-me completamente mais uma vez.
- Não te preocupes que nada farei se não te der prazer. Quis mostrar-te quem manda. - Perversamente afirmou.
- Hummmmm... - Amordaçada, veementemente protestei contra a assustadora provocação.

Da mesma forma que foi quebrado o silêncio voltou. Imóvel e indefesa, numa expectativa que me deixa com uma ampliada e reactiva sensibilidade.
As suas mãos caem pesadamente sobre o meu corpo iniciando a exploradora maratona. Gradualmente leva-me ate próximo do limite ao adicionar os lábios e a língua. Percorre-me por completo, lenta e avidamente, sem fronteiras nem tabus, minuciosamente controlando o meu descontrolo.
Mantém-me infinitamente na corda bamba, em suplicantes gemidos para que me leve ao céu. 
As amarras são tão fortes quanto o desejo.
Até que, no momento que escolhe, me faz escorrer de desvairado prazer e não me permite parar, como é seu pérfido método.
Mais uma vez me leva para além do limite até que, esgotada e absolutamente sem posse do meu próprio corpo, me liberta abandonando-me, na cama, em anárquicas contracções, sem conseguir conter ténues gemidos a cada expiração.
Observa-me possessivamente durante toda a longa recuperação.
Finalmente, entrega-me a camisa de noite cuidadosamente dobrada.
Deslocamo-nos para o quarto onde enroscados facilmente nos perdemos no sono.
De manhã acordo com a sua voz enquanto abre as portadas da pequena varanda.
- Acorda preguiçosa. - Docemente ordenou enquanto transportava um enorme tabuleiro cheio, para mesinha da varanda.
Vesti um grande e pesado roupão que me deixara sobre a cama e sentei-me à mesa.
Depois da tempestade a bonança, como já é habitual.
Tomamos, com toda a calma e tempo, um precioso pequeno almoço.
Havia um detalhe não me saia da cabeça e que, cada vez mais tenho necessidade de perguntar. Não resisti.
- Precisas mesmo ter um quarto de lenços e fazer tudo aquilo? - Disparei crua e directa.
- Preciso. - Respondeu de imediacto.
- E se um dia eu não quiser? - Arrisquei questionar.
- Não faço.
- Assim? Não ficas com falta?
- Fico. Mas não faço.
- Consegues esse controlo?
- Sim. Controlo sempre tudo. Controlo-me a mim.
- Já percebi que sim.
- Não queres mais passagens pelo quarto dos lenços?
- Não disse isso. Apenas queria saber se tinha escolha.
- Tens sempre.
- Gosto de ti. - Saiu-me espontaneamente enquanto o abraçava.

Passamos a resto do fim de semana juntos. As semanas que se seguiram vimo-nos entre viagens. Os lenços frequentemente presentes, a criatividade sempre que possível e as pontuais perversões no quarto dos lenços quando planeado.
Tenho tudo mas sinto-me incompleta. Os luxos não compensam as repetidas, e por vezes extensas, ausências. 
Ambos sabemos que podemos estar num beco sem saída. Este fim de semana foi o reflexo desta incerteza. Não foi apenas o stress que me fez pedir que me raptasse. A necessidade de ter a exclusividade da sua atenção terá sido provavelmente mais importante.

O tempo avança, mas o nosso relacionamento não. Aparentemente temos tudo, mas o luxo, o erotismo e a forma como gostamos um do outro já não serão suficientes para compensar a ausência.
Não me parecia possível adiar mais e, nas vésperas de nova série de viagens, tivemos de enfrentar a realidade. Decidimos fazer um intervalo com fim indeterminado. 
Voltei a casa lavada em lágrimas mais pela falta de solução que pela despedida, que até seria possível reverter.
Resolvi comprar uma caixa. Uma caixa que me parecesse especial. 
Cheguei a casa, vesti-me confortavelmente, lavei as mãos e a cara. Fui para o quarto e despejei todos os lenços sobre a cama. Contei, organizei e finalmente arquivei os lenços todos na nova caixa.

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