Quadrado Textil

Quadrado Textil
Lenço (latin linteum, -i, pano de linho) s.m. Peça de roupa, que consiste num pedaço de tecido, quadrado, com que se abriga o pescoço ou a cabeça.

quinta-feira, 16 de agosto de 2018

O Reino dos Sentidos

Pouco passava das seis horas da tarde quando vestia o casaco, para regressar a casa. Estava já escuro e um frio próprio da estação que convidava a ficar barricado entre paredes. 
Alguém me liga! 
É a minha amiga Susana. Cheia de energia acumulada durante a semana e pronta para a esgotar logo na sexta à noite. 
- Vamos fazer alguma coisa diferente. Quero aproveitar o fim-de-semana. - Pediu avidamente.
- Eu estava mais a pensar ficar sossegado com o comando da televisão - Respondi com muita inércia.
- Não sejas preguiçoso. É sexta-feira. O fim-de-semana é curto. Temos de aproveitar.
- Mas tenho de ser eu? - Brinquei num tom sarcástico.
- Lá estás tu. Sabes que és o único a me aturar. Eu faço-te ir. Sabes que não tens escolha. - Respondeu à letra.
- Agora és ditadora?
- Eu uso um lenço... - Provocou baixinho sabendo ser infalível.
- Onde e a que horas? - Aceitei, de imediacto, sem nenhum esboço de contestação.

Susana, amiga de longa data, é uma das raras mulheres que conhece um pouco da minha secreta fraqueza. Sabe que, aos meus olhos, fica irresistível de lenço e os seus pedidos irrecusáveis.
- Quero experimentar coisas diferentes e surpreender os meus sentidos. Vamos jantar a algum local mais exótico.

Vai usar um lenço e quer surpreender seus sentidos! É uma combinação muito interessante que capturou a minha imaginação. Parece óbvio.
- Já tens alguma ideia em mente? - Interroguei semi-desafiante.
- Que tal ir à Moraria num desses restaurantes marroquinos e comer algo inédito. Vamos no escuro sem planos.
- Jantar? Mas assim nem permite ir a casa antes.
- Claro que mão. Vem ter comigo ao meu trabalho. Vamos directos. E não te preocupes que já estou a usar o lenço prometido. - Novamente provocou.
- Vou agora. Até já. - Obedientemente aceitei.

Como combinado, pouco tempo passara e estava á porta do seu trabalho. Durante a curta viagem não pensei em nada mais que não fosse a sua provocação. Que lenço usaria? Como o usaria? Logo a vi sair com um lenço grande, escuro, estampado, perfeitamente atado com nó francês - duas voltas e nó à frente - cumprindo a provocadora promessa. 
Não consegui disfarçar o olhar, embora tentasse. Sou facilmente detectado, por apenas quem conhece o meu segredo.
- Olá. Chegaste rápido. - Cumprimentou provocante enquanto passava os dedos pelas pontas do lenço.
- Olá. Cheguei. Já estava de saída.
- Gostaste do meu lenço? - Sorrido perversamente.
- Sabes que sim... - Meio comprometido
- Então vamos?
- Sim, vamos. Queres ir a pé? Temos tempo. - Sugeri.
- Estava a pensar no mesmo.

Como era cedo e a caminhada de cerca de meia hora, descemos, calmamente, a longa avenida. Não podia perder a oportunidade de aproveitar toda a sua energia e vontade para orientar a conversa.
- Conta-me melhor como queres surpreender os teus sentidos. - Questionei cheio de segundas intenções.
- Não quero surpreender os sentidos. Quero que me surpreendam os sentidos.
- E o jantar é suficiente? - Prossegui em subtil provocação.
- Claro que não, tonto. Sabes bem que não. Quero aproveitar o fim-de-semana. Já tens compromissos para este?
- Infelizmente... - Respondi muito sério.
- Infelizmente o quê? - Não desistindo sem dar luta.
- Infelizmente, não tenho nada. - Agora em tom de gozo.
- Parvo. Agora vais ter.
- E que vou eu ter?
- Vais ter de me levar.
- Levo-te para o reino dos sentidos? - Desta vez nada subtil.

Fez-se silêncio, por escassos segundos, na expectativa de um inesperado fado. Seria esta a primeira surpresa, em forma de proposta, por desvendar?
Susana corou tanto com a forma directa como pelo que subitamente imaginara por lembrar um filme icónico.
- Sim, quero. Quero muito - Respondeu baixo escondendo o olhar.

O silêncio voltou. Ambos mudos, com vontade que seja o outro a retomar o tema.
Chegamos ao restaurante marroquino e, um pouco mais descontraídos, escolhemos os exóticos pratos e bebidas. Nem sabia bem o que iria comer e voltei à provocação enquanto esperávamos.
- Tinhas consciência do risco que corrias ao vires propositadamente de lenço?
- Sim, tinha. Quero correr esse risco.
- Mas para surpreender uns sentidos temos de privar outros... - Insisti na provocação.
- Sei bem onde queres chegar.
- Diz-me onde?
- Vais vendar-me para surpreender.

Confirmei apenas com o olhar sem nada mais dizer no momento em que chegavam os pratos. 
A mescla de paladares pouco habituais tornou-se oportunamente no tema da conversa. 
Rematado o jantar com um perfeito chá de menta estava na hora de decidir.
Para não ficarmos num constrangedor "minha casa ou tua", mais apropriado para relacionamentos diferentes da nossa velha amizade e cumplicidade, deixei uma subtil sugestão:
- Devo precisar de algumas coisas que não temos aqui.
- E onde estão?
- Em minha casa. Podemos lá ir.
- Sim, vamos. - Sem hesitar concordou.

Apanhamos um táxi. Não levou muito tempo para nos deixar no destino.
No hall do edifício, pacificamente deserto a esta hora, olhando-a nos olhos enquanto esperávamos elevador, decidi, desde logo, apimentar o ambiente.
- Vou preparar-te para a entrada no reino dos sentidos.
- Não sei se já estou pronta. - Surpresa pela súbita embora previsível, ideia.
- Ainda bem que não. Fica mais interessante.

Com as pontas dos dedos desatei cuidadosamente o lenço que usava no pescoço. 
Hesitante Susana coloca a mão de lado no pescoço, sobre o lenço, num sensual movimento, como se estivesse a oferecer resistência. Retiro-o muito devagar deixando-a sentir o tecido suavemente escorrer pelo pescoço. Aproveito a perfeita dobra, em fita, já feita e aproximo o lenço dos seus olhos denunciando a minha intensão.
Embora nesta hora vazio, o hall do prédio é local de passagem e o risco de cruzar com um vizinho e ficar numa situação embaraçosa é catalisador do crescente desejo. Vendada entra no elevador segura ao meu braço direito, fortemente apertado pelas suas duas mãos. 
O risco de, na subida até ao décimo sétimo andar, ter algum inoportuno encontro dá uma perversa sensação de lentidão.
Propositadamente rodo-a e mudo de posição para a deixar ainda mais perdida e obrigada a prestar mais atenção aos sentidos ainda disponíveis.
Ao chegar, coloco-me por trás, seguro-a pelos braços um pouco acima dos cotovelos e posiciono-a de frente para a porta do elevador, que se abre nesse momento. Está exposta, sem qualquer forma de disfarçar caso apareça alguém. Pode ser embaraçoso para ambos, embora em diferentes perspectivas. Premeditadamente hesito dois longuíssimos segundos. Desvio-a ligeiramente para a direita e saio cuidadosamente para o patamar do andar.
- Boa noite - Digo num tom baixo.

Sinto alguma resistência no seu corpo por temer ter sido assim exposta.
Segue conduzida no escuro forçado, na minha frente, poucos metros até à porta. Roda-a até a deixar de costas e ligeiramente afastada da porta. Tenho espaço para abrir lentamente a porta. Destranco a fechadura blindada volta a volta pausando um instante entre cada uma das quatro voltas. 
- Então? - Sem conseguir manter o silêncio ansiosa por sair daquela posição.
- É só abrir a porta.
- Fazes de propósito.
- Claro que faço. É um ritual de iniciação.

Novamente segura por ambos os braços, ainda de costas para a porta, recuamos até ao interior do apartamento. Fecho a porta e tranco da mesma forma que destranquei.
A sua expressão corporal demonstra que agora relaxou depois desta atrevida entrada. Retiro lentamente o seu casaco e penduro juntamente com o meu. Disfruto deliciado da visão que é Susana em pé, no hall, com o seu lenço atado sobre os seus olhos e as pontas descaídas sobre os ombros, sem nenhuma noção do que vai acontecer em seguida.
Suavemente coloco-me à sua frente encostado. Abraço-a levemente pelo tronco oferecendo o meu ombro para encostar a cabeça. Docemente abraça-me à volta do pescoço encontrando um porto seguro.
Imoveis quedamo-nos por longos e calorosos minutos.
- Espera um pouco. Tive uma ideia - Subitamente pedi.

Afastei-me lentamente e fui para a sala deixando-a perdida no meio do hall. 
Afastei tudo o que podia afastar abrindo algum espaço no meio da sala. Coloco uma relíquia de CD com slows dos anos oitenta, pronto a arrancar.
Volto ao hall, agarro levemente nas suas duas mãos e dirigindo-nos até ao fofo tapete do centro da sala. Ajoelhei-me e retirei pausadamente cada uma das suas botas.
- Quando deste "boa noite" ao sair do elevador estava mesmo alguém? - Não resistira a quebrar o silêncio com a embaraçosa dúvida, enquanto a descalçava.
- Nunca saberás. - Deixando-a deliberadamente sem resposta.
- És impossível...
- Shhhh... - Interrompi encostando suavemente o meu indicador direito aos seus sedosos lábios.

Ficou obedientemente imóvel.
Descalcei-me também. Com o comando coloquei o CD a rodar.
Logo aos primeiros acordes de "Take my breath away" deixa escapar um profundo suspiro de surpresa e entrega. Com a ponta dos dedos e uma leveza de pluma pego na sua mão direita e coloco sobre o meu ombro esquerdo. Da mesma forma coloco a sua mão esquerda sobre meu ombro direito. As minhas mãos posicionam-se lentamente, simétricas, um pouco acima das suas ancas.
A ritmo da música o abraço vai subindo e fechando suavemente. Susana deixa-se ir embalada pelo slow apenas sentindo por nada ver.
Assim dançamos até ao final do CD. Já passara mais de uma hora que estava vendada. Os seus sentidos estavam totalmente alerta e a sua curiosidade desperta.
Calcei-lhe umas quentes pantufas, demasiado largas por serem minhas, que a impediam de perder o conforto.
Novamente dei-lhe ambas as mãos. Dirigi-a para cozinha. Coloquei uma chaleira bem cheia com água. Enquanto não fervia escolhi as saquetas para infusão, abri o congelador e retirei gelo e gelados. No momento em que a chaleira sonoramente atingiu a fervura despejei todo o gelo num jarro com água, já fria, da torneira. O som do gelo a cair fora propositadamente abafado pelo som da água que fervia. 
Coloquei, numa caneca, uma saqueta de menta e noutra gengibre e limão. Em duas taças gelado de chocolate e morango respectivamente.
Alice, desorientada sob o som da fervura e todos os outros ruídos dos preparados, sente o fresco da cozinha provocado por uma fresta da janela aberta.
Dentro da pia coloco um pequeno alguidar de plástico virado para baixo e aproximo a toalha de mãos.
Enchi as canecas com a água que fervera escorrendo de alto de modo a que o som seja bem audível.
- Vou aquecer-te. Sobrou demasiada água quente.
- Mas vais deixar arrefecer... Aaaaahhhh... - Gritou retirando as mãos quando lhes verti toda a água.

Sentira o choque térmico pela grande diferença na temperatura.
Parecia-lhe uma crueldade fora do contexto mas, instantes depois do choque, já não sentia as mãos a queimar. Sentia frio. Tinha despejado o jarro de água gelada facilmente trocado quando a provocada não pode ver. O receio de se queimar condicionou seus sentidos dando-lhe a errada sensação de calor escaldante.
Tinha o reflexo de tirar o lenço dos olhos para perceber o que se passara mas foi impedida pela toalha com que lhe secava as mãos. Abracei-a firmemente com um pequeno remorso pelo grande susto.
Calcei-lhe umas grossas luvas de neve, que não servem apenas para aquecer, fechei a fresta da janela e sentei-a à mesa. Agora, subtraído o tacto nas mãos, multiplicou o olfacto e audição.
Calmamente coloquei as chávenas e as taças na mesa.
- Parecia queimar. Assustaste-me. Era isso que querias? - Num quase doce tom de protesto.
- Não. Apenas provoquei os teus sentidos, como pediste.
- Parvo. Vais ver quando eu tirar o lenço dos olhos.- Em brincadeira ameaçou.
- Não será para breve.
- Que mais tens planeado?
- Logo... sentes.

As infusões já deveriam estar numa temperatura bebível.
Retirei as luvas e coloquei as suas mãos à volta da caneca com menta.
Vendada, com as pontas do seu lenço pairando, Susana perfuma o ambiente de sensualidade. Tento me manter concentrado para não ir longe demais acompanhado o meu desejo.
- Cheira tão bem.
- Prova. Não tem açúcar.
- Está forte, a menta. Gosto!
- O adoçante vem separado. Experimenta. - Retirando uma colher de gelado de chocolate.

Instintivamente abriu a boca percebendo que era a óbvia opção neste cenário.
O frio do gelado e o doce do chocolate contrastavam com o sabor da infusão de menta quente.

- Muito “After Eight”. Tão bom. - Deixou escapar
- Era o apropriado. Afinal já passou das oito.
- Como pensaste nisto tudo?
- Algo sensual me inspirou. - Muito subtilmente confessei.
- Foi meu lenço fez tudo isso?
- Foi. Quando propositadamente usaste sabendo que me provoca.

Discretamente troquei as canecas mas foi facilmente detectado o aroma.
- É outro chá. - Afirmou segura
- Experimenta. 
- É forte, ácido e picante. Mesmo forte! - Sentindo um ardor nos lábios.
- Consegues saber de quê?
- Gengibre...
- Mais limão.
- Testas os meus sentidos. És maléfico.
- Muito. - Insisti retirando uma colher de gelado de morango.
- Que suave! Muito cremoso. Delicia.

Conduzida pelo suave tom de conversa e pelas sensações cada vez mais ampliadas por estar vendada Alice percorria a meu reino dos sentidos. Colher após colher, gole após gole, som após som.
Levantei-me com toda a calma e posicionei-me por trás da sua cadeira repousando pesadamente as mãos sobre seus ombros. Uma suave e longa inspiração confirma a sua curiosidade pelo que possa passar. Desatei o nó do lenço e docemente ajustei-o sem lhe destapar os olhos.
- Que vais fazer? Não conseguiu conter a pergunta.
- Se te dissesse... - Deixei propositadamente a resposta incompleta.
- Que mau... - Ironizou.

Em silêncio levantei-a da cadeira, dei ambas as mãos e levei-a novamente para a sala. Com o controlo remoto liguei a música antes de entrarmos. Susana rendera-se totalmente à minha imaginação. Subo um pouco o volume da música para esconder o som dos meus movimentos enquanto a deixo precisamente no meio do tapete onde havíamos dançado. Preciso de uns minutos para preparar alguns detalhes noutro lado do apartamento. Sem maiores demoras voltei. Por uns momentos fico apenas a observa-la. Perdida no centro do fofo tapete, envolvida na música, na expectativa que mais lhe possa acontecer e, principalmente, retida no escuro que o seu lenço, atado sobre seus olhos, lhe impôs. Saboreio pormenorizadamente todos os momentos desta visão. 
Abro a porta da pequena varanda, guio-a pelas nas suas mãos e dirijo-a para fora. Saímos e encosto a porta. Um cortante ventinho fustiga as nossas faces.
Apenas uns mal medidos segundos bastaram para o frio penetrar nos nossos corpos.
- Posso juntar o útil ao sensualmente agradável? - Colocando os dedos sobre o nó da venda.
- Podes... - Sem perceber exactamente o que estava a responder.
- Não abras os olhos ainda. - Após desatar.

Desdobrei o lenço e abri-o totalmente agitando. Cuidadosamente dobrei em triângulo. Docemente coloquei sobre a sua cabeça, passei as pontas sob o seu queixo, meticulosamente ajustei e atei atrás do pescoço.
- Confortável? 
- Sim. Muito. Protege a cara e o pescoço. Nunca usei assim.
- Só aqui.
- Como sabes atar o lenço assim neste estilo Grace Kelly?
- Vi em fotografias. É tão sensual que não esqueci. – Sem confessar tudo o que sei sobre lenços.
- Então eu estou sensual assim? - Sem resistir a deixar uma pequena provocação.
- Se eu te dissesse quanto, o teu rubor das bochechas não seria do frio.
- Tonto... - Respondendo a primeira coisa que lhe passou pela cabeça.
- Podes abrir os olhos.

Do alto do décimo sétimo andar, neste gélido dia de céu limpo de inverno, a visibilidade estava magnífica. Estrelas brilhantes e toda a iluminação da cidade exposta sob os nossos olhares.
- Que vista bonita tens de noite! Afirmou tão surpresa como fascinada.
- Nas noites frias como esta fica espectacular. 
- Está frio mas apetece ficar.

Com um pesado cobertor azul, já preparado, colocado a partir das minhas costas, abraço-a com vigor, por trás. Repousando as mãos abaixo do seu peito resguardo com lã todo o seu corpo. Encosta-se aconchegada e segura apreciando o calor do contacto.
- Como planeaste tudo isto? - Incrédula repetiu a pergunta.
- Foi quase espontâneo. Embora sempre imaginasse algo assim nunca o fizera. Mas hoje usaste a chave para abrir a minha caixa de pandora.
- O meu lenço! Sabia do teu gosto mas não imaginava... - Sussurrou 
- Paro quando quiseres. - Interrompi responsavelmente.
- Não quero que pares. Nunca...

Cerro, ainda mais, o abraço e deixamo-nos ficar longos minutos simplesmente a contemplar. 
Para além da vista comtemplava também Alice com o lenço na cabeça deliciosamente composto e irresistivelmente sedutor. Esta paragem permite-me melhor pensar o que se segue.
Sinto pelo suave movimento uma ligeira inquietação. Chegamos ao oportuno momento de retirar da varanda.
Lentamente abro o cobertor, saio para o frio, e volto a fechar sobre ela. Coloco-me silenciosamente na sua frente olhando-a perversamente nos olhos. Com mãos sobre os ombros, como num abraço largo, até chegar ao nó do lenço atado atrás, calmamente desato e desliso-o suavemente pela sua cabeça.
Com melhor perícia que possa ter, dobro em fita e seguro-o á sua frente implicitamente declarando a minha intenção como já tinha feito antes.
Alice, sem nada dizer, confirma o seu consentimento ao puxar o cabelo para trás e lentamente fechar seus olhos.
Ligo o CD com o comando e deixo fluir. Novamente ato o lenço sobre os seus olhos. Sempre muito lentamente para maximizar este momento de extraordinário erotismo.
Reentramos na sala e volto a dirigir Alice ao centro do tapete. Retiro gentilmente o cobertor que a aquece. Sem que se aperceba o seu corpo suavemente serpenteia ao som da música. Agachado descalço-a e descalço-me também. Levemente pouso as mãos sobre seus tornozelos e vou subindo, pelo lado das pernas até aos joelhos. Paro por momento apenas para provocar a sua curiosidade. Torno a subir até parar nas ancas acompanhando o seu movimento.
Subo mais um pouco até ao limite do peito sem tocar. Paro novamente e por mais tempo, criando uma deliciosa indecisão. Muito devagar inicio o contorno do seu corpo até completar um fechado abraço. Seus braços enrolam-se ao meu pescoço encostando a cabeça entre o meu peito e ombro, entregando-se à música que nos envolve, num constante e repetitivo movimento que dura até o CD se esgotar em silêncio.
Imóveis ficamos...
Suavemente acaricia a minha nuca com as pontas dos dedos. É tarde.
- Apetece-me ficar aqui esta noite... - Sussurrou ao meu ouvido.

Sem nada dizer levo-a para a suite. Abro a porta da casa de banho e acendo apenas a ténue luz do armário para não agredir seus olhos com a intensidade da luz após, estar no escuro tanto tempo.
Frente à porta desato suavemente o lenço que a venda.
- Na bancada tens uma embalagem nova com uma escova de dentes e uma t-shirt minha. Nada terminou - Orientei colocando o lenço na sua mão.
- Parece planeado! Como sabias?
- Fico à tua espera. - Escusando-me responder às suas pertinentes questões.

Rapidamente vou à cozinha para mais uns pequenos preparativos que trago para o quarto.
Ouço o abrir da porta. Alice, cumprindo a sugestão, voltou com os olhos já vendados.
Mais uma vez levo-a. Desta sem contacto.
- Vem. Segue a minha voz. 
- Para onde?
- Para onde eu quiser. 
- Que mau. - Ironizou
- Não fui eu quem começou.

Diversas voltas demos ao pequeno apartamento até pararmos, no quarto. Alice, de costas para a cama, com os lençóis previamente abertos sem
que se apercebesse, com as pernas encostadas à cama, virada para mim. Com uma ligeira pressão sobre seus ombros discretamente indico que quero que se sente. Novamente pelos ombros, com uma mão em cada um, faço com que se deite de barriga para baixo. Com as pontinhas dos dedos, qual pinças e leveza de pena, seguro na extremidade da t-shirt perto dos joelhos. Com extremo cuidado e delicadeza subo demoradamente a t-shirt. Aos poucos deixo à mostra as suas pernas, as suas nádegas pelo contorno das pequenas rendas das suas cuequinhas brancas, o dorso, as omoplatas, os ombros e retiro cuidadosamente os braços. Maior cuidado e precisão para retirar do pescoço e da cabeça de forma a não perder o lenço que a venda.
Mais uma vez delicio-me com a erótica imagem de Alice: descontraída, deitada de barriga para baixo na minha cama, apenas de cuecas, de olhos vendados pelo seu lenço, com seu corpo exposto e a sua mente na expectativa.
E tão tentador mas devo seguir o plano.
Aproximo, arrastando ruidosamente, as duas pequenas taças que deixara preparadas.
A primeira com óleo de amêndoas e lavanda, um preparado para relaxar, cuidadosamente aquecida mas sem excessos.
Pingo lentamente ao longo da sua coluna, a partir do pescoço até ligeiramente abaixo da cintura. Muito leve e lentamente, com ambas as mãos, espalho o calor por todas as suas costas. Faço uma pequena pausa apenas por provocação e pingo o seu braço esquerdo, do ombro até à mão. Da mesma forma espalho o óleo no seu braço esquerdo, do ombro até à ponta dos dedos. Pauso por um momento e repito, com exactidão no braço direito.
Faltam as pernas. Pingo demorada e alternadamente dos tendões de Aquiles até à nádega. Com as duas mãos em simultâneo espalho pelo mesmo percurso. De forma insistente e repetitiva tomo ainda mais tempo. Os meus dedos pairam sobre os tendões, os gémeos, as articulações dos joelhos, as coxas até encostar nas nádegas sem ir mais longe.
Volto aos ombros numa repetitiva e aquecedora fricção que percorre todo o corpo do pescoço até aos pés. Com as pontas dos dedos, como se arranhasse sem unhas, subo pelo seu braço esquerdo até aos ombros e, seguidamente, desço do mesmo modo até á mão direita. Sinto o seu discreto relaxe subjugado a sensação da suave massagem.
Pouso longamente as mãos abertas sobre os seus ombros, com os polegares assentes no seu pescoço. Sempre lentamente volto a deslizar para baixo. Agora com crescente intensidade e maior fricção. 
Alice prevê que há fronteiras que podem vir a ser ultrapassadas mas em nada demonstra oposição.
Chego ao limite das suas cuecas. Com os dedos em pinça percorro o perímetro desenhado pela renda do centro para os lados descendo-as um ínfimo centímetro. Repito, no sentido oposto, do lado para o centro descendo-as um segundo centímetro.
Deixo a sua imaginação divagar enquanto contemplo seu corpo quase despido. Cada minuto que passa torna-se mais complicado gerir a tentação. 
Pouso as mãos sobre os calcanhares. Percorro as suas pernas, no sentido ascendente, repetidamente acarinhando até às nádegas. 
Exploro os seus sentidos até ao limite da minha imaginação esperando chegar ao limite da sua.
Percorro, como antes percorri, o perímetro da renda sobre a zona inferior das suas nádegas. Igualmente afasto a renda um e outro centímetro expondo-a ligeiramente.
Cuidadosamente levanto, com a minha mão, o seu ombro direito indicando a intenção de a rodar. Faço-o muito de leve para permitir que discretamente bloqueie o movimento, caso se sinta constrangida por, pela primeira vez, ficar tão exposta ao meu olhar e sujeita ao meu desejo.
Embora não me surpreendesse reparei na forma instantânea como Alice respondeu ao meu toque, como se fosse uma vontade reprimida à procura de se libertar.
Aproximo a outra taça. Pego no que sobra do gelo já parcialmente derretido. Deixo cair um pingo de água gelada nos seus lábios. Aperta-o como se mordesse os lábios confessando o seu estado. Mais um pingo verto. Tenta deter antes que escorra. 
Um a um vou pingando água gelada a partir de um cubo de gelo ao ritmo que derrete.
-  Não penses num filme. - Provoquei cirurgicamente.
- Nove semanas... - Tarde demais já me fizeste pensar. É o segundo que subtilmente sugeres.
- Então... - Fazendo cair, entre os seus seios, a fracção de gelo que ainda não derreteu nos meus dedos.

Profundamente inspira e suspira elevando o peito sobre as suas omoplatas.
O gelo escorrega lentamente em direcção ao umbigo. Capturo-o, com os lábios, imediactamente antes de chegar ao destino, aspirando-o energicamente. Repito diversas vezes com outros tantos fragmentos de gelo. Aguardo um momento para aumentar a expectativa e deixo cair um pingo sobre seu firme mamilo esquerdo. Gentilmente encosto os meus lábios quentes ao frio do pingo e contorno o mamilo, com a língua, drenando qualquer vestígio de água.
Trato o outro mamilo com rigorosa igualdade. Mais um gelado pingo verto em cada mamilo repetindo previsivelmente o mesmo percurso.
Passo a passo a fantasia e o desejo levam-me muito mais longe que antecipara horas atrás. Coloca à prova a nossa sólida amizade. Pisamos solo desconhecido e Alice não demonstra vontade de abrandar.
Coloco um fragmento logo abaixo do seu umbigo. Mantendo uma ligeira pressão com um dedo por cima deslizo calmamente até sob o elástico das suas cuecas. Passo esse elástico pora cima do gelo para segurar enquanto derrete. 
Como anteriormente terei de reaquecer o que arrefeci. Pouso os lábios sobre seu umbigo suavemente aquecendo a sua pele. Percorro o caminho do gelo derretido aquecendo-o até encontrar. Sugo-o tão enérgica como ruidosamente. Entre a surpresa e o quase susto sinto, passados alguns segundos, as suas pernas a relaxar, discretamente afastadas de modo a permitir livre-trânsito.
O desejo e a razão travam uma luta titânica. Não planeara chegar tão longe mas o encadeamento dos estímulos aos seus sentidos teve um efeito devastador sobre os meus e levou-nos até aqui. 
O tempo não para, apesar de o parecer, e a taça com gelo já só contém água.
Alice percebe que a minha hesitação que não condiz com o momento.
- Porque paras? Não me vais deixar assim... - Avisou subtilmente que o ponto de não retorno já estava ultrapassado.
- Não permitas que deixe. - Respondi a primeira coisa que me passou pela cabeça.

Vendada, como se visse, agarrou o meu cinto com as duas mãos, abriu violentamente, desapertou os botões e baixou as minhas calças. O boxers quase arrancados de seguida.
Dispo a camisa sem que note no meio da desta tempestade.
Com os dedos, tentando um quase impossível autocontrolo, passo pela renda das suas cuecas e dificilmente resisto a baixar mais que poucos centímetros. Novamente retomo o percurso conquistando um pouco mais, deixando-a ligeiramente mais exposta. Repito a manobra diversas vezes, adicionando centímetros à sua nudez, sendo propositadamente lento. Não deixo que o seu levantar das ancas me apresse mesmo estando no limiar da minha resistência. Após algum tempo, descidas as suas cuecas aos joelhos, Alice esperneia e chuta-as para fora. Passadas horas de preliminares, logo a partir do elevador, atingi o limite da sua resistência.
- Já não consigo esperar mais... - Sussurrou puxando firmemente a minha erecta masculinidade para si.

Posicionado entre as pernas, inclinado sobre o seu tronco, com uma mão em cada lado encosto-me levemente. 
- Vem para mim. - Descontrolada ordenou agarrando-me solidamente pelas duas nádegas, com os dedos tão cravados, que não permitia escapar.

Todo o seu corpo ardia, todos os seus poros debitavam desejo. Puxou-me para dentro de si trancando-me com suas pernas. Desisti de toda a cortesia e desliso puxado até ao fundo, como o desejo há muito suplicava. Invertem-se os papéis. Mesmo vendada é Alice quem conduz. Vale, agora, tudo, sem quaisquer restrições.
Entro e saio da sua profundidade como se fosse o último dia do mundo e perdemo-nos no tempo em extenuantes fricções. 
Chegados ao limite, derrotados pelo cansaço e sono, simplesmente enroscados, adormecemos.


QT

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